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Channel: ATALAIA - V.N.BARQUINHA
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Ribeira da Atalaia

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Sobre o título “A ocupação do Pleistocénico Médio e Superior da Ribeira da Atalaia (Médio Tejo – Portugal Central), publicado na revista Arqueologia e História da Associação dos Arqueólogos Portugueses, Luiz Oosterbeek, Pierluigi Rossina, Sara Cura, Stefano Grimaldi e José Gomes, dão-nos a conhecer, neste precioso artigo, o sítio arqueológico da Ribeira da Atalaia.
Localiza-se este sítio precisamente junto da Ribeira a Ponte da Pedra, a alguns quilómetros para norte do local onde a ribeira desagua no Tejo, perto da vila. O sítio é ao ar livre. 
Um artigo muito curioso que dá a entender os testemunhos da mais antiga presença humana em território português, estudo do devir do comportamento e da cultura, projecto de investigação e escola académica, museografia de evolução das paisagens ribeirinhas e da sua exploração.
Pelo denodo e pesquisa científica destes arqueológos podemos concluir que o homem de Neandertal viveu na Atalaia há 300 mil anos.

Despedida do P.e José Manuel Laranjeira

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"A fé sem obras está morta", São Tiago 2:14-26


O P.e José Manuel Laranjeira foi ordenado presbítero em 26-05-1990. Em 1994 foi nomeado pároco de Vila Nova da Barquinha, Moita do Norte e Atalaia. Em 15-09-2012 deixa de exercer a pastoral no nosso concelho. Durante 18 anos (con)viveu entre nós!
A tomada de posse dos novos párocos P.e Ricardo Miguel Neves Madeira e P.e Fernando Henrique Giuli, nomeados in solidum (solidariamente), ocorreu dia 15 de Setembro nas suas novas paróquias: Sagrada Família do Entroncamento, Atalaia, Barquinha e Moita do Norte. Também, no dia 22 tomam posse em Tancos e no dia 23 na Praia do Ribatejo. Nestas duas últimas freguesias, são nomeados párocos in solidum com oP.e João Luís Correia Fanha da Graça. 
No jantar da despedida do P.e Laranjeira, realizado no dia 16 de Setembro, na Casa do Patriarca, em Atalaia, estiverem presentes cerca de 300 pessoas. Amigos, paroquianos, membros do clero, autarcas, associações, etc. assinalaram a sua presença. Muita gente para agradecer a sua obra, o seu pensar, o seu querer e o seu agir!
As comunidades ao verem-no partir sentem-se desgostosas. Mas, certamente, o carisma dos novos nomeados atenuarão este desgosto e abrirão o caminho para novos tempos e novas generosidades.
Aqui fica, sinteticamente e para memória futura, a fundamentação da sua obra pastoral e física (1): 
Desde 2008, em acumulação, com as paroquias da Atalaia, Moita e Barquinha, foi pároco de Tancos e da Praia do Ribatejo, abarcando ainda as comunidades das Madeiras e das Limeiras. 
Realizou uma obra verdadeiramente extraordinária, em vários domínios, não só na sua área de jurisdição das freguesias como também ao nível vicarial e diocesano, de que se destaca:
- Vigário do Entroncamento, órgão que abrange as paróquias dos concelhos da Golegã, Entroncamento e de Vila Nova da Barquinha;
- Membro nomeado do Conselho de Vigários e membro eleito do Conselho Presbiteral, respetivamente, órgãos de decisão e de consulta da diocese de Santarém;
- Assistente Diocesano da Juventude Operária Católica (JOC) e da Liga Operária Católica (LOC);
- Membro do Observatório da Comissão Nacional Justiça e Paz para as questões laborais e sociais;  
- Membro Fundador do grupo de teatro “Fatias de Cá-Barquinha”, tendo-se destacado também como ator em várias peças de teatro desse Grupo;
- Praticante, com relevo, de várias modalidades desportivas;
Realizações projetadas e realizadas, ao nível do património religioso e para religioso edificado, muitas delas com o apoio das autarquias locais e do Estado, cuja enumeração sumária se indica:
- Construção da Casa Mortuária em Vila Nova da Barquinha;
- Recuperação da Capela de Rocamador;
- Construção da sede para o Agrupamento dos Escuteiros em Vila Nova da Barquinha;
- Construção da Casa Mortuária em Atalaia;
- Construção da Casa de Apoio à igreja matriz de Atalaia;
- Recuperação da Capela do Senhor Jesus da Ajuda em Atalaia;
- Recuperação do Coro e Capela-Mor da igreja paroquial de Moita do Norte;
- Tratamento do vidrado dos azulejos e pintura de paredes e vãos da igreja matriz de Atalaia;
-Iluminação do Largo da Capela em Moita do Norte;
- Construção do Centro Social Paroquial em Atalaia, uma obra exemplar e há muito desejada pela população;
- Construção de anexos e melhoramentos na Casa Mortuária em Moita do Norte;
- Recuperação de salas de catequese em Moita do Norte;
- Recuperação da antiga residência paroquial e sua transformação em Centro de Catequese e Caritas Paroquial de Vila Nova da Barquinha;
- Recuperação da igreja matriz em Vila Nova da Barquinha, que consistiu na beneficiação da Sacristia, colocação de pavimento novo no corpo central da igreja, de novo altar, pinturas e reposição dos altares laterais com retorno à traça original.
Ao nível social e sócio-caritativo:
- Constituição das Conferências de São Vicente de Paulo das paróquias de Atalaia e de Moita do Norte;
-Patrocinador da constituição da Caritas Paroquial de Vila Nova da Barquinha;
- Promotor de todas atividades e funcionalidades relacionadas com a instituição do Centro Social Paroquial de Atalaia, do qual é Presidente da Direção, desde a sua inscrição como IPSS, da abertura das várias valências, da candidatura ao PARES e ao PRODER;
- Sócio fundador da Associação de Paralisia Cerebral de Vila Nova da Barquinha e membro da Comissão Instaladora do sub-núcleo da referida Associação.
Por todas estas obras, aliadas à sua personalidade determinada e solidária, bem como ao seu carácter humilde e humanista, o P.e José Manuel Laranjeira distinguiu-se nos campos social, cultural, económico, humanitário, desportivo e comunitário.
(1)   Fundamentação inserta na atribuição da medalha municipal de mérito – Grau Ouro, conferida pela Assembleia Municipal, por proposta da Câmara, deliberação tomada por unanimidade.

Censo da População de 1527 - Tancos, Paio de Pele, Atalaia, Asseiceira e Punhete

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A parte deste Censo, referente à província de da Estremadura que existe na Torre do Tombo, tem por título: Registo das cidades, vilas e lugares que há nesta Comarca da Estremadura e dos moradores que há em cada um deles. O qual se fez por mandato de El Rei nosso Senhor. Feito por Jorge Fernandes escrivão da Chancelaria da dita Comarca. Foi começado aos 15 de Agosto na cidade de Coimbra no ano de Nosso Senhor jesus Cristo de 1527 anos.
Deste censo retiramos os seguintes elementos relativos à nossa região:
Vila de Tancos - a 24 de Setembro de 1527 anos,estando eu Jorge Fernandes na vila de Tancos que é de D. Jorge de Menezes, com o juiz e outras pessoas, me informei no certo dos moradores e termo da vila de Tancos, e achei o seguinte:
A vila de Tancos tem 118 vizinhos no corpo da vila, dos quais 3 são escudeiros e 10 viúvas, e o mais povo.
O Casal do Torrões 2 vizinhos.
Não tem mais nenhum termo povoado.
Tem de termo um quarto de meia légua para a parte de Atalaia e Ceiceira.
Parte com a ribeira que é da Ordem de Cristo, e com as vilas da Atalaia e Ceiceira.
E eles assinaram no próprio.
Soma 120 vizinhos.
A vila de Paio de Pele. Este julgado de Paio de Pele tem 21 vizinhos.
No termo deste julgado está o Castelo de Almourol que tem um alcaide.
Este julgado tem de termo uma légua para a parte da vila de Tancos.
E parte com o rio Zêzere e com o rio Tejo e com a ribeira de Tancos e com o termo da Ceiceira.
E por assim ser assinou no próprio Diogo Peixoto escrivão daí.
Jorge Fernandes o escrevi.
Soma 22 vizinhos.
A vila da Atalaia. Esta vila de Atalaia que é de D. Jorge de Menezes tem 147 vizinhos no corpo da vila.
Título do seu termo - aldeia da Mouta tem 62 vizinhos. Tem mais 23 casais no circuito do termo da vila em que há 23 vizinhos.
E tem de termo meia légua para todas as partes.
Parte com a vila da Ceiceira e com a vila de Torres Novas e Tancos e com o termo de Santarém.
Segundo mais compridamente tenho por assinado do juiz e escrivão daí: Jorge Fernandes o escrevi.
Soma ao todo 232 vizinhos.
A vila da Ceiceira. Fui eu escrivão à vila da Ceiceira que é do dito D. Jorge e achei haver 40 vizinhos no corpo da vila.
Título do seu termo: A Lagoa do Grou tem 1 vizinho. A Roda tem 16 casais em que há 17 vizinhos. A Minhaveira tem 15 vizinhos com os seus casais
Tem de termo parte de Tomar meia légua e para a parte de Punhete tem de termo outra meia légua e para a Atalaia tem um terço de meia légua e da Ceiceira a Atalaia légua.
Parte com as vilas de Atalaia e Tomar e Torres Novas e Paio de Pele.
E por assim ser assinou o juiz no livro que em meu poder fica.
Jorge Fernandes o escrevi.
Soma 47 vizinhos.
A vila de Punhete que é deste condado de Abrantes tem 311 moradores, deste 7 escudeiros e 8 clérigos e o mais povo.
A vintana do Pego tem 53 vizinhos.
A vintana de Santa Margarida tem 42.

Bibliografia: Serões de Tancos, n.º 8
Sobre o censo de 1878, vide
Sobre os censos de 1822, 1883, 1940 e 2001, vide





O numeramento de 1527 e a origem da Moita do Norte

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Desconhecemos as origens da Moita do Norte.
Não olvidando que existe a estação paleolítica de Aldeinha, Barreira Vermelha, onde foram achados diversos artefactos do paleolítico inferior, certo é que em 1467, num relato sobre a capela de Santa Maria de Almourol que se erguia no Castelo de Almourol era testemunha, entre outros, Jorge Alvares morador na Mouta (1).
Eis a primeira referência que encontrei sobre esta terra.
Também, compulsando os Tombos da Ordem de Cristo (1504-1510) vemos uma courella de Gonçal Eanes da Mouta, a folhas (fls) 118, outra no monte da Arnena da Mouta e da Atalaya, a fls. 119, outra de Martim Dias da Mouta, a fls. 146 verso, o que atesta que no início do século XVI já a Moita tinha residentes.
O censo de 1527 historia que a aldeia da Mouta tem 62 vizinhos, maior número populacional que a Asseiceira que, naquele tempo, detinha 47 vizinhos em todo o território do concelho o que demonstra a existência de um aglomerado significativo para o tempo. Podemos então inferir que o lugar deverá ter origem, provavelmente, nos finais do século XIV primórdios do século XV.
Releva como monumento proeminente a  capela de Nossa Senhora dos Remédios. António Carvalho da Costa na sua Corografia Portuguesa, 1706-1712, faz uma referência à ermida da Moita dedicada a Nossa Senhora dos Remédios o que nos leva a afirmar que a sua construção poderá ser anterior ao século XVIII.
Esta tem na capela-mor um retábulo de altar policromado e dourado, bem delineado no conjunto e completo nos ornamentos fundamentais com dois pares de elegantes colunas que acompanham a tribuna e frontão recortado em volutas e contra-volutas decoradas com folhas de acanto.

       (1)    Livro 52.º, a fls. 22 v. do corpo Christo, do Arquivo da Torre do Tombo

Igreja da Atalaia antes de 1941

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Antes da intervenção de 1941 a Igreja da Atalaia era um monumento muito doente que apresentava elevado estado de degradação. Em consequência deste restauro, que se encontra minuciosamente discriminado no Boletim de 1941, relevo a retirada do altar-mor, em talha dourada, que no dizer dos técnicos estava assente sobre o antigo e que ocultava com o seu retábulo grande parte da capela e alguns belos artesões da abóbada. Mais de afirma que, sem mérito artístico ou tradicional que recomendasse a sua conservação, apeou-se e repararam-se os estragos que a sua instalação tinha provocado, construindo um altar em cantaria semelhante ao primitivo e ainda se construíram mais dois altares laterais que, revestidos de azulejos, substituíram outros vulgares de madeira que desapareceram e cujo traço podemos observar no Boletim da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, ano de 1941.
Apesar de sabermos que os entalhadores adotavam um estilo suave e delicado que dava um sabor palaciano à arte religiosa, não fico convencido com os doutos argumentos dos técnicos. Tenho algumas reservas se a Igreja ficou mais bela com a retirada da talha uma vez que a abóbada com as nervuras ficava visível.
Para os leitores apreciaram junto o aspeto do altar-mor e da nave lateral, todas em talha dourada, como era antes da intervenção de 1941 (fotografia ao lado).
Na Igreja da Atalaia releva a capela-mor onde podemos apreciar a abóboda de nervuras, estreladas que morrem em elegantes mísulas (ornato, que ressai de uma superfície, geralmente vertical, e que sustenta um vaso, um busto, um arco) relevadas. No fecho da abóboda uma pedra circular, com cruz floral em relevo, sobre o qual assenta o escudo de armas dos condes da Atalaia.
Podemos deliciarmo-nos com o altar lateral onde existe uma edícula (edifício de pequenas dimensões em forma de templo, de tabernáculo ou de nicho com colunas, que contém uma estátua ou uma pintura) de cantaria com finíssimos coluneis exteriores, assentes em mísula e com cabeças humanas nos capitéis. Jambas curiosamente trabalhadas com figuração humana em três ordens sobrepostas parecendo tratar-se de simbologia ateia ou não bíblica mas de sentido hermético ou esotérico. O fundo da parede lisa fora, possivelmente, pintura.
Na capela batismal podemos observar a pia batismal de pedra, com taça circular assente em base quadrada. Na guarda dos santos óleos, edícula de pedra da região de emoldurado simples que envolve na base duas pequenas carrancas (caras disformes, de pedra, madeira ou metal). Sobre o litel um leque concheado acompanhado de grossos acrotéreos (pedestais das figuras, sobrepostas na frontaria) decorados com ligeiro relevo. Fecha a edícula um bonito jogo de grade de ferro, com três ordens sobrepostas de pequenos balaustres. Uma peça de muito interesse.
Posterior à construção da Igreja que é 1528 podemos ver um púlpito à base de pedra, oitavada, com data de 1674 que se encontra assente em mísula de taça e voluta, tudo de muito bom desenho e o balaústre é fino e feito de pau santo.

Igreja da Atalaia, Concerto de Natal, 22 Dezembro, pelas 21h

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PROGRAMA 22 DE DEZEMBRO 2012
IGREJA DA ATALAIA 21h
         
- II Cantata do Natal de F. Lopes-Graça
1- À ordem de César
2- José e Maria
3- Nasceu, já nasceu
4- O menino nas palhas
5- Da serra veio um pastor
6- Inda agora aqui cheguei
7- Quem vos vem dar boas-festas

- El niño perdido - J. Nin-Culmell
- Pie Jesu - A. Lloyd-Webber
- The Lord Bless You and Keep You - John Rutter
- Do varão nasceu a vara - F. Lopes-Graça
- Ó meu menino - Eurico Carrapatoso
- Total Praise - R. Smallwood
- Elijah Rock - Moses Hogan
- Ev’ry time i feel the spirit - William Dawson
- Soon ah wiil be done - William Dawson

Desde quando existem templos religiosos na Vila da Atalaia?

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1528 - Pilastra da Igreja

Desde quando existem templos religiosos na Vila da Atalaia?
Questão de difícil  resposta. 
Recuemos até ao reinado de D. Pedro I, anos de 1357 a 1367. Com a morte de D. Lourenço Rodrigues, bispo de Lisboa, em 1364, o rei manda proceder ao inventário do falecido. Ficamos a conhecer que “constituem rendimentos episcopais os direitos sobre vários templos da diocese, com particular incidência para as igrejas da cidade e do termo de Lisboa, da Azambuja, Alenquer, Almoster e das vilas e dos termos de Santarém (S. Salvador, S. Julião, S. Nicolau, S. Mateus, S. Martinho, Santo Estêvão, S. Lourenço e Santa Cruz de Santarém, Santa Maria de Marvila, S. Pedro da Arrifana, Almonda e Atalaia) … Dão também corpo a este levantamento o cadastro das igrejas onde D. Lourenço Rodrigues tinha arrendada a terça pontifical (Entre outras, as igrejas de Pederneira, Cós, Maiorga, Aljubarrota, Cela Nova, Évora de Alcobaça, Turquel, Santa Catarina de Póvoa, Alpedriz, Pontével, Almoster, S.Lourenço e S. Julião e S. Martinho de Santarém, S. Paulo de Salvaterra, Atalaia… “ (1)
Tal, já existia igreja na Atalaia ao tempo do falecimento do bispo de Lisboa, em 1364.
Mas onde se situaria esta consabido que a actual Igreja Matriz da Atalaia fora construída em 1528 como demonstra a gravação numa pilastra que ladeia o arco da sua capela-mor?
Podemos conjecturar que a nova igreja fora construída sobre a antiga o que era frequente à época. No Boletim da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (2) é levantada a hipótese de ter existido no chão da Igreja ou nas suas imediações outro templo de mais modesta construção a onde deve ter pertencido a imagem da virgem, escultura gótica do século XIV, que sempre se venerou na Atalaia.
Na minha singela opinião inclino-me para que a Igreja matriz fosse a ermida de S. Sebastião, situada no "Rocyo", a escassos 300 metros da actual igreja matriz, pois parafraseando o Prior Bernardo Marques de Carvalho, nos inquéritos paroquias de 1758 este assegura que aquela ermida “algum dia serviu de matriz”. Certo é que das pesquisas que efectuei não consegui chegar a nenhuma conclusão sustentável permanecendo esta questão no limbo como muitas outras da nossa terra.
Outra questão deveras curiosa é a questão da padroeira da Atalaia.
Hoje temos por designação que é Nossa Senhora da Assunção. Porém, a imagem de pedra, de boa escultura, atribuível a Diogo Pires, o Velho, que assenta numa mísula renascença (3), figura proeminente na sua capela-mor da Igreja da Atalaia é Nossa Senhora com o menino ao colo e, seguramente, não é a padroeira. Conforme escreveu Frei Agostinho da Santa Maria no Santuário Mariano, “a sua forma não diz com o mistério, porque tem sobre o braço esquerdo o Menino-Deus”. Assim, apesar da sua beleza, é descabido denominar-se de padroeira a imagem da escultura de pedra do altar-mor. Esta é, seguramente, Nossa Senhora da Atalaia. Singular é referir que nos painéis de azulejos inferiores há duas imagens da Virgem que caracterizam o novo oráculo e o antigo, Nossa Sr.ª da Rosário, o antigo, e Nossa Sr.ª da Assunção, o novo. Porque será que a Padroeira foi relegada para 2.º plano? Não sei responder. Certo é que a fundação e o povoamento de Portugal coincidiram com um grande devoção mariana motivada pelo ideal da idade média de exaltação da mulher, cujo exemplo perfeito era a Virgem Maria.
Por conseguinte seria lógico que Maria Santíssima fosse escolhida para padroeira de quase metade das igrejas das terras sucessivamente incorporadas no território português e que, também, a nossa Igreja da Atalaia lhe seja dedicada.


(1)SARAIVA, Anísio Miguel de Sousa – O quotidiano da Casa de D. Lourenço Rodrigues, bispo de Lisboa (1359-1364†): notas de investigação. Lusitania Sacra. Lisboa. 2005
(2)A Igreja Matriz da Atalaia, Boletim da Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, n.º 24.  Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais, Lisboa, 1941
(3)Diogo Pires-o-Velho notabilizou-se no campo da escultura, em Coimbra, executando  inúmeras esculturas de Nossa Senhora com o Menino




Atalaia, Fevereiro de 1668

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Cosme de Médicis, o terceiro Grão-Duque da Toscana, visitou Portugal no tempo em que ainda era príncipe herdeiro, em 1668-1669. A esta viagem se refere D. António Caetano de Sousa, na História Genealógica, tomo II, nos seguintes termos:
«Príncipe benigno e mui estimador dos eruditos, mui afável com os estrangeiros, magnifico e de bons costumes. Sendo moço e príncipe herdeiro correu as principais côrtes da Europa e esteve na nossa de Lisboa. Era então príncipe regente D. Pedro 2.°. Aposentou-se no Colégio de S.to Antão dos Padres da Companhia. Foi o Pe. António Vieira o intermediário para que o Príncipe Regente o recebesse... ».
De entre a numerosa comitiva do Príncipe, destacavam-se o Conde Lourenço Magalotti, que redigiu o relatório da viagem, e o pintor florentino Pier Maria Baldi, o artista «minucioso e fiel”, verdadeiro repórter fotográfico do tempo, que desenhava tudo quanto pelo caminho o impressionava, cidades, vilas, aldeias, estalagens e humildes pousadas (em cima, pintura da vila da Golegã e de Tomar).
“De Santarém à Golegã são quatro léguas e outras tantas, da Golegã a Tomar. Todo o caminho percorrido desde Lisboa até o mencionado lugar de Tomar é uma série quase ininterrupta de aldeias, vilas, jardins e casas, umas agrupadas, outras dispersas, que se estendem por uma larga faixa de terra entre os montes e o Tejo. Os campos não podemos nem pintá-los mais belos nem desejá-los mais férteis ou amenos: o trigo, o linho, as oliveiras, os pinhais, os pomares, as hortas e as pastagens, onde se vê toda a espécie de gado, juntos à frequência das construções e à abundância de população, à temperatura branda do ar e à maravilhosa variedade do terreno, aqui erguendo-se em suavíssimos outeiros, acolá estendendo-se em plainos uniformes banhados por frequentes e copiosas poças de águas pluviais que a terra retém, tudo isto forma um quadro extraordinariamente aprazível. As povoações que se encontram de Lisboa a Tomar são: Vila Longa, Alhandra, Vilafranca, Povos (que é do Conde da Castanheira, como acima se disse), Vila Nova da Rainha, Azambuja e a mencionada tapada de D. Fernando Manuel, duma légua de circunferência, mas ainda não totalmente fechada nem povoada de caça, Cartaxo, Santarém, Golegã e Atalaia, fora da qual se vê por acabar um grande palácio quadrado de boa e nobre arquitectura, e que é do Conde que tem por título o nome da dita povoação (1). Aqui os campos circunvizinhos não estão tão cultivados, mas em troca são maravilhosamente adequados a caçadas, sendo da esterilidade da terra abundante recompensa a multiplicidade dos animais que aí se encontram.

(1)   Em 1668-69 era senhor da Casa da Atalaia D. Álvaro Manoel de Noronha, casado com D. Inês de Lima. Acusado pelo Santo Ofício teve de abandonar o reino, viajando pela Itália e Alemanha durante 12 anos. (In Tribunal do Santo Ofício, Inquisição de Lisboa, proc. 806 - Auto 1666, estante 8, auto 38, maço 1, n.º 6)

Bibliografia:
Barata, José H. Cosme de Médicis e o Ribatejo. Separata de Biblos, Vol XXII, tomo 1, Coimbra, 1947
MAGALOTTI, Lorenzo, 1637-1712 - Viaje de Cosme de Médicis por España y Portugal (1668-1669) / edicion y notas por Angel Sánchez Rivero y Angela Mariutti de Sánchez Rivero. - Madrid : Sucesores de Rivadeneyra, [1933]
Agradecimento: À Prof.ª Manuela Poitout, que me facultou os elementos históricos.


Santa Casa da Misericórdia da Atalaia

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Na Atalaia existiu a Santa Casa da Misericórdia. Situava-se na Rua Patriarca D. José, em frente ao Palácio dos Condes da Atalaia, atual Casa do Patriarca.
O primeiro documento que se conhece é o alvará de D. Filipe I, de 15 de Fevereiro de 1588, confirmando o Compromisso da Misericórdia da Atalaia (1)
 “ (Na margem esquerda: “Da Mysericordia d’ Atalaya”) Eu el Rey faço saber aos que este alvara virem que eu vy este Compromisso da Confraria da Mysericordia da vila da Atalaya, e por fazer merse por esmola ao provedor e irmãos da dita Confrarya que ora são e aos que pelo tempo forem, me praz de lhe confirmar como de feyto per este allvara confirmo e ey por confirmado o dito Compromisso, na forma que nelle se contem, e asi ei por bem que elles possão daqui em diante gozar e usar de todo o contiudo no dito Compromisso e que se lhes cumpra e guarde inteiramente na maneira nele declarada, naquelas cousas a que se poder applicar somente, vista a informação que acerca disto por meu mandado tomou o doutor Ayres Ferrnandez Freyre do meu Desembargo e desembargador da Casa da Supllycação. E mando a todas as justiças, officiais e pessoas a que pertencer que asi o cumpram sem duvyda nem contradição allg˜ua e este allvara quero que valha etc. Pero de Seixas o fez. Em Lixboa, aos xb de Fevereiro de mil bc lxxxbiii.”
Outrossim, no inquérito paroquial de 1758, o prior da Atalaia, Bernardo Marques de Carvalho à questão: “10. Se tem hospital, quem o administra, e que renda tem? Se tem Casa de Misericórdia, e qual foi a sua origem, e que renda tem; e o que houver  notável em qualquer destas cousas?” Respondeu : “Tão bem tem caza de Mizericordia de que são Provedores alternativos o Ex.mo Sr. Cardeal Patriarcha, e o Ex.mo Snr. Marques de Tancos, e tem anexo hü Hospital  para os passageyros, e Caza para todo o Religioso que vay de passagem pedir per noutar, cuja renda liquida he cada ano trinta mil reis e teve seo principio no de mil, quinhentos, oitenta, e oito.” (2)
Assim, podemos concluir que a Misericórdia foi presumivelmente criada perto do ano de 1588 uma vez que o alvará é uma confirmação do compromisso e ignoramos a data da celebração desse compromisso.
Uma carta régia, de 4 de Junho de 1588, ordenou ao provedor da Comarca de Tomar que procedesse à anexação do hospital e albergaria da vila à Confraria (3). Pode-se também acrescentar que a Irmandade desta vila, apesar das várias dificuldades que poderiam eventualmente colocar em causa a sua existência, conseguiu impor-se no socorro aos necessitados uma vez que em 1712 a Misericórdia é relatada por Carvalho da Costa na sua Corografia (3). Outrossim, em 1739 na obra “Descripçam corografica do Reyno de Portugal” (4) é referido que a Atalaia tem Misericórdia e 455 fogos e 1478 almas.
No final do ano de 1869 a Misericórdia estava em estado de completa ruína, a que não será alheio o afastamento da população pela instituição e a ascensão da Barquinha com o seu comércio fluvial, Em consequência decretou-se a sua extinção. Para tal terá contribuído o relatório do governador civil, João Rocad da Costa Cabral (5) que com verbo duro sentenciava o seu fenecimento: “Na villa da Barquinha não há um hospital nem misericórdia, porém em cada uma das duas freguezias ruraes deste concelho, Atalaia e Tancos, há uma irmandade da misericórdia, cujos rendimentos são tenues, porém mais tenues são ainda os serviços que prestam à humanidade”. Nas conclusões do relatório mais refere que as misericórdias de Tancos e da Atalaia, entre outras, tiveram uma aplicação pia mas que, naquela data, em 1867, eram gastos rendimentos em inutilidades e muitas das vezes a capricho dos mesários, podendo converter-se em proveito da humanidade de forem incorporadas nos hospitais do concelho.

(1)       IAN/TT – Chanc. de D. Filipe I, Doações, liv. 18, fl. 75v.
(2)       Pereira, Julio Manuel. A Região da Barquinha no Séc. XVIII. A visãp dos inquéritos paroquais. Edição da Câmara Municipal. 1993
(3)       Portugaliae Monumenta Misericordiarum / ed. lit. Centro de Estudos de História Religiosa da Faculdade de Teologia – Universidade Católica Portuguesa; Vol. 5: Reforço da interferência régia e elitização: o governo dos Filipes.2006 e  IAN/TT – Chanc. de D. Filipe I, Privilégios, liv. 1, fl. 209-209v.
(4)       Costa, António Carvalho da – Corografia Portugueza e descripçam topografica do famoso Reyno de Portugal. Lisboa: Valentim da Costa Deslandes, 1706-1712. 3 vols.

A Vila de Tancos e os seus templos.

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A Vila de Tancos está situada na encosta do vale do Tejo, a dois quilómetros a jusante do Castelo de Almourol e defronte da povoação do Arrepiado. 
          Segundo Pinho Leal o antigo nome de Tancos tem origem no topónimo Francos pois, para este autor, a localidade teria sido fundada por cavaleiros francesas que vieram ajudar D. Afonso Henriques na reconquista cristã, acreditando-se que o nome Tancos seja uma deturpação de Francos, ou franceses. Não é de admirar ele silogismo uma vez que a localidade está perto do Castelo de Almourol e do Castelo Ozezere, pontos estratégicos nos primórdios da nacionalidade.
            O traçado urbano de Tancos, tal como em Vila Nova da Barquinha, cresceu junto do rio e em volta do seus cais. Em Tancos, o cais, chegou a ser de alvenaria. A partir do rio estruturavam-se todas as outras ruas da Vila.
          A construção na zona ribeirinha é feita à base de granito, tal como o cais, a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição e a sua Misericórdia. O granito era explorado, ali bem perto, nas pedreiras da margem esquerda e direita junto de Almoroul. É precisamente junto à margem do Rio Tejo que nasce a Misericórdia de Tancos. Sabemos que a Misericórdia de Tancos foi instituída em 1582. “ Num alvará régio, de 30 de Agosto de 1582, regista-se o pedido dos oficiais da Câmara e do povo da dita vila: os officiais da Camara da vila de Tancos me enviaram dizer que elles com o povo da dita vila ordenarão e instityrão ora novamente a Confraria da Misericórdia e ellegerão provedor e irmãos della…”  Nesse mesmo documento é solicitado ao rei que outorgue o regimento da misericórdia de Lisboa à recém criada Irmandade de Tancos”.
Em Março de 1583 existe outro “ Alvará régio autorizando a Misericórdia da vila de Tancos, por um período de três anos, a pedir esmola “no tempo das novidades” nas vilas da Atalaia, Asseiceira e Carregueira”.
          O pórtico renascentista da Misericórdia ostenta o escudo de armas dos Condes da Atalaia, Manóeis, a quem se deve a sua edificação. Outrossim, em Maio de 1590 aparece um Alvará régio pelo qual ordena que se anexe à Misericórdia de Tancos o seu Hospital. Na mesma não haveria roda dos expostos a que não será alheio o esplendor comercial que se verificou no Século XVI e XVII devido ao seu excelente porto com transações comercias e comunicação com as províncias do norte e Alentejo. Da Beira vinha azeite, madeiras, carne de porco, frutos, etc. e do Alentejo vinha o trigo.
          Grande deveria ser a sua azáfama naqueles tempos pois ainda hoje é possível vislumbrar, a norte da Vila, os colossais rastos das rodas de carros de bois insertos na rocha granítica.
          A sua decadência, no Séc. XVIII e XIX, deveu-se a um imposto de 50 rs por pipa, e 30 rs por carga, uma Provisão Régia com destino à sua Misericórdia, imposto que não era quebrado nos outros portos e que foi uma das causas do desvio do comércio fluvial para a Barquinha, Punhete e Abrantes.
          O relatório do governador civil, João Rocad da Costa Cabral, no século XIX, sentenciou a morte da Misericórdia de Tancos:  “Na villa da Barquinha não há um hospital nem misericórdia, porém em cada uma das duas freguezias ruraes deste concelho, Atalaia e Tancos, há uma irmandade da misericórdia, cujos rendimentos são ténues, porém mais ténues são ainda os serviços que prestam à humanidade”. Nas conclusões do relatório mais refere que a misericórdia de Tancos, tal como na da Atalaia, em 1867, eram gastos rendimentos em inutilidades e muitas das vezes a capricho dos mesários, podendo converter-se em proveito da humanidade de forem incorporadas nos hospitais do concelho.
          Se conseguimos saber a data da criação da Misericórdia de Tancos  questão mais difícil é precisar a construção da sua Igreja Matriz.
          Recuemos até ao censo de 1527, referente à província da Estremadura que existe na Torre do Tombo e que tem por título: “Registo das cidades, vilas e lugares que há nesta Comarca da Estremadura e dos moradores que há em cada um deles. O qual se fez por mandato de El Rei nosso Senhor. Feito por Jorge Fernandes escrivão da Chancelaria da dita Comarca. Foi começado aos 15 dias de Agosto na cidade de Coimbra no ano de Nosso Senhor jesus Cristo de 1527 anos.     Deste censo retiramos os seguintes elementos relativos a Tancos: Vila de Tancos, a 24 de Setembro de 1527 anos, estando eu Jorge Fernandes na vila de Tancos que é de D. Jorge de Menezes, com o juiz e outras pessoas, me informei no certo dos moradores e termo da vila de Tancos, e achei o seguinte:
          A vila de Tancos tem 118 vizinhos no corpo da vila, dos quais 3 são escudeiros e 10 viúvas, e o mais povo.
          O Casal do Torrões 2 vizinhos.
          Não tem mais nenhum termo povoado.
          Tem de termo um quarto de meia légua para a parte de Atalaia e Ceiceira.
          Parte com a ribeira que é da Ordem de Cristo, e com as vilas da Atalaia e Ceiceira.
          E eles assinaram no próprio.
          Soma 120 vizinhos”.
          A construção da Matriz de Nossa Senhora da Conceição, de Tancos, deverá andar muito perto da data do censo de 1527, ou seja início do Século XVI, uma vez que existem lajes de sepulturas, desta época, no solo do templo.             
Os Inquéritos Paroquiais de 1758, contam-nos a sua rica história: "A Parochia esta dentro da villa em alto. (O seu?) orago he Nossa Snr.ª da Conceyção. Tem sinco Altares dos quaes o mayor, que esta está na boca ( ... ) esta o Tabernacullo do Santíssimo Sacramento, tem no meyo a Imagem de Nossa Snr.ª da Conceyção de vestir e aos lados o Snr. S. Pedro e o Snr. S. Sebastião. (oo.) O Snr. S. José, e o Snr. S. Vicente Ferrer.
Tem quatro Altares colaterais, da parte direyta esta colocado nc seu altar o Snr. St.º António, e aos lados o Snr. S. Francisco, e o Snr. St.º  Amaro, e logo abayxo da mesma parte, porem no corpo da Igreja, esta  o  altar das almas (com?) seu retabulo de pintura antiga, e nele hua crux, com hua pintura de (hum? Cristo?) crucificado a poucos annos posta.
Da parte da Epistolla esta o altar de nossa Snrª. do Rozario  (…) seus lados a Snr.ª St.ª Marta, e a Snrª. St.ª Luzia o qual tem sua ( ...) dourada. Logo mais abayxo da mesma parte, em o corpo da Igreja esta o altar do Snr. S. Thomaz Arcebispo de Cantuaria e nelle hum retabullo antigo, com excelente pintura dos passos do mesmo Senhor e no meyo hum com imagem do mesmo Santo de vulto.
          A Igreja he de huma so nave, e de abobeda antiga. Dize que fora mandada Jazer pello Snr. Rey D. Manoel, como bem a Igr.ª da Mizericordia, e hum famoso caes, tudo o antiga, maz muito segura, a parece ser do mesmo autor, do mesmo tempo; a Igreja tem torre, e dous sinos, mas não Beneficiados, posto que tem hum grande coro.
Tem a Igreja três Irmandades: a do Santíssimo, e a de nossa Snrª. da Conceyção padroeyra, e das almas, todas seus compromissos, os quaes hoje mal se observão ou pella demenuição em que hoje se acha a terra por falta de cabedais, ou frieza de devoção.
O Parocho chamace Prior, a quem apresenta o Illmo. Exmo. Marquez de Tancos, e redem da Igreja quanto a dizimas, mal chegava, hum anno (vinte?) e quatro a vinte e sinco mil reys, que unidos ao pe de altar podem chegar alguns annos a pouco mais de cem mil reys".
       A igreja matriz merece uma vista demorada relevando no templo o património, a arquitectura e a história. Também, no seu interior podemos apreciar paredes cobertas de azulejos com painéis do Séc. XVII-XVIII. 
           É monumento classificado como Imóvel de Interesse Público, por Decreto n.º 2/96, DR, I Série-B, n.º 56, de 6-03-1996.

Bibliografia:
Mação, Helder Vitória Mação. Tancos : ecos do passado no presente /. 1a ed. Vila Nova da Barquinha : Câmara Municipal, 1995.
Serões de Tancos, n.º 8, Gazeta dirigida por Júlio Costa, 1926.

Igreja da Atalaia - monumento funerário de D. José Manoel da Câmara

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Igreja da Atalaia - monumento funerário de D. José Manoel da Câmara
No altar-mor da Igreja da Atalaia podemos apreciar o monumento funerário de D. José Manoel da Câmara, segundo patriarca de Lisboa.
Mas quem foi este insigne conterrâneo?
D. José era nono filho de D. Luiz Manoel de Távora, quarto Conde de Atalaia e senhor de Tancos e de D. Francisca Leonor de Mendonça. Nasceu em 25 de Dezembro de 1685 segundo relato de Bernardo Marques de Carvalho, prior da vila da Atalaia, conforme consta das Inquirições paroquiais de 1758. Foi batizado na Igreja da Atalaia no dia 6 de Janeiro de 1686. Estudou em Coimbra e foi provedor da Santa Casa da Misericórdia da Atalaia, fundada por alvará de D. Filipe I, de 15 de Fevereiro de 1588, e foi designado Patriarca de Lisboa em 7 de Março de 1754.
Fez a sua entrada solene na patriarcal, na baixa de Lisboa, no dia 7 de Setembro de 1754. Durante 3 noites consecutivas acenderam-se todas as ruas da cidade de Lisboa para celebrar este acontecimento. Viria a ser eleito Cardeal, por Papa Bento XIV, a 10 de Abril de 1747.
Na sequência do terramoto de 1755, que destruiu Lisboa, deixa o palácio dos Marqueses de Tancos, para se instalar num palácio onde hoje é a Igreja de S. Roque. A seguir ao terramoto, dedica-se ao auxílio material e espiritual da população. Ao ser informado dos muitos cadáveres insepultos nos templos, nas ruas e entre as ruínas dos edifícios, mandou o cardeal patriarca D. José Manoel às comunidades e aos párocos que «acudissem com toda a diligência a sepultar os mortos», tendo-se visto empregues nestes «santos fins» e a trabalhar «com devotíssimo fervor», de «enxadas às costas e nas mãos», os «mais autorizados» religiosos que se esforçavam por «dar sepultura aos mortos e preservar os vivos do contágio». Não faltou o socorro material garante o religioso franciscano arrábido Fr. Cláudio da Conceição, autor do Gabinete Histórico, às «milhares de pessoas, que vagavam pelos campos vizinhos da cidade e pelo lugares do termo de Lisboa, sem casas, sem roupa, sem dinheiro para o preciso alimento», pelo que, contam os relatos, «ninguém morreu de fome». Sebastião de Carvalho e Melo, mais conhecido por Marquês de Pombal, interroga o Cardeal Patriarca se os mortos devem ser enterrados em valas comuns ou metidos em batelões e lançados ao mar. O Cardeal num gesto de grande sabedoria e de saúde pública advoga pela última hipótese pois se os corpos fossem sepultados em valas comuns contaminariam as águas do subsolo e tal facto, certamente, geraria elevado número de mortos. O Cardeal opta, à época, por uma solução sanitária, lúcida e determinada. Em confronto com algumas posições assumidas com o Marquês de Pombal, mormente a perseguição à Companhia de Jesus, e gravemente doente, retira-se para a Atalaia “para tomar ares” onde veio a falecer em 8 de Julho de 1758.
À data existiam graves acusações sobre os jesuítas, denúncias que se baseavam em factos propositadamente excessivos para descrédito da Companhia de Jesus. No fundo pretendia-se alcançar que o patriarca perseguisse os jesuítas. Certamente a instâncias do Marquês de Pombal que já lhes proibira que pregassem na igreja patriarcal, depois de serem proibidos de pregar na capela real. O patriarca D. José Manoel, pela sua parte, não os tinha em mau conceito. Isto infere-se do facto de nomear dois deles, os padres Machado e Romano, examinadores prossinodais, já depois daquela proibição.
No princípio de Junho tentou-se arrancar ao patriarca uma ordem violenta de perseguição aos Jesuítas, a de os suspender de confessar e pregar na diocese de Lisboa. O marquês de Pombal dirigiu-se ao paço patriarcal e ali instou por semelhante decisão, recorrendo a todos os meios que lhe inspirava a sua perversidade. Disse ao prelado que era aquela a vontade de El-Rei, e que seria irremediavelmente destituído da patriarcal se não cumprisse. D. José Manoel, mais de septuagenário e doente, hesitou perante a ameaça, e pediu tempo par deliberar. O ministro, vendo que ele fraquejava, redobrou de esforços, até que o obrigou, depois de cinco horas de resistência, a dar a ordem naquela mesma, tarde. Mesmo de noite a imprimiram, e na manhã seguinte apareceu afixada por toda a cidade de Lisboa. Os próprios termos da ordem prelatícia acusam iniludivelmente a coacção em que foi dada. É do teor seguinte: “Por justos motivos, que nos são presentes e muito do serviço de Deus e do público, havemos por suspensos do exercício de confessar e pregar em todo nosso patriarcado aos Padres da Companhia de Jesus, por ora, enquanto não ordenarmos o contrário. E para que chegue a noticia de todos…”, etc. (conforme, Edital do Cardeal Patriarca de Lisboa José Manoel da Câmara de Atalaia de 7 de Junho de 1758, em que proíbe os Jesuítas de confessar e pregar no seu patriarcado. Lisboa : s.n., 1758. Portugal, Torre do Tombo, SP 3558 -10).
A sua sobrinha, a Marquesa de Tancos, foi uma das pessoas que o amparou e confortou na dor e na doença durante um período de três anos vindo a expirar na sua Atalaia. O túmulo de D. José da Câmara encontra-se no interior da Igreja da Atalaia e os seus restos mortais encontram-se sepultados por debaixo do altar-mor.
Imputa-se a construção do monumento funerário a D. Constança Manuel, Marquesa de Tancos e sobrinha do patriarca e que na data da morte do prelado era herdeira da Casa da Atalaia. A sua sobrinha para demonstrar a sua gratidão ao Patriarca honrou-o na morte com a construção de uma sumptuosa sepultura no lugar mais nobre da Igreja. Para João Soalheiro e Celina Bastos que fizeram ume rigorasa investigação sobre a vida do nosso Cardeal, a obra poderá ser do arquitecto Mateus Vicente de Oliveira ou do arquitecto Joaquim de Oliveira, a quem é atribuído a obra da Igreja das Mercês em Lisboa, construída entre 1753-1803.
O túmulo é em pedra da região, em forma de capela, envolvendo um argo cego de fundo talhado onde encrava a pequena arca tumular. Sobre o arco há um agradável conjunto com o símbolo de armas do patriarca, arma dos manoeis, com a teara e dois ramos patriarcais. Nas histolibatas leões rompantes. No monumento consta, em latim, a seguinte inscrição e da qual se dá a devida tradução: “D. José. Manoel I, Cardeal Presbítero da Santa Igreja Romana, Patriarca da Santa Igreja de Lisboa. Regeu o Patriarcado durante 4 anos, 1 mês e 19 dias. Viveu 72 anos, 6 meses e 14 dias. Faleceu no ano do Senhor 1758, no dia 9 do mês de Julho. Descanse em paz.»
Os seus restos mortais do nosso cardeal repousam na Atalaia e não no Panteão dos Cardeais, ao lado dos demais cardeais da Igreja Católica, no Mosteiro de S. Vicente de Fora, em Lisboa. É o único que aí não se encontra.

Bibliografia
Marques, João Francisco. A acção da Igreja no terramoto de Lisboa de 1755: ministério espiritual e pregação. Lusitania Sacra. 2006
Arquivo Distrital de Santarém, Vila Nova da barquinha, Freguesia da Atalaia, Batismos 2 (1674-1741).
Os Patriarcas de Lisboa, João Soalheiro e Celina Bastos, Alêthea, 2009

Rua do Sal

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O traçado urbano da Barquinha cresceu junto do rio e em volta do seu cais. A partir do rio organizavam-se todas as outras artérias da Vila.
O desenvolvimento urbano deu-se a partir do século XVII e é consequência da decadência do porto de Tancos. A existência de um imposto de 50 rs por pipa, e 30 rs por carga, uma provisão régia com o propósito de ajudar a Misericórdia de Tancos, imposto que não era quebrado no porto da Barquinha, foi uma das razões da deslocação do comércio fluvial para a novel Vila.  Certo é que todo o comércio e transporte fluvial, que acontecia no Rio Tejo, desviou-se para o porto da Barquinha que passou a ser uma vila mercantil e alba. Os fluxos comerciais entre as Beiras, Ribatejo e Lisboa faziam-se, principalmente, pelo rio, levando e trazendo permanentemente produtos que aqui eram transbordados, comercializados e levados do e para o interior dos territórios adjacentes, como é exemplo o sal, o azeite, as madeiras, a retrosaria, etc.
A construção das casas na zona ribeirinha era feita à base de granito e de pedra. Também os cais dos prédios adjacentes eram destes materiais, base predilecta de construção dos nossos antepassados. O granito era explorado nas pedreiras da margem esquerda e direita junto de Almoroul. Na rua da Restauração, a mais perto do rio na parte sul, localizavam-se os cais onde atracavam os barcos por um canal  ou doca. Ainda hoje se podem vislumbrar os antigos poiais e escadas, sempre mais altos do que o normal curso de água para evitar a sua entrada no interior dos armazéns.
Surge o presente escrito a propósito de uma demolição que está a ocorrer numa casa na baixa da Barquinha num edifício da família Condeço transmitida por compra e venda a duas pessoas de nacionalidade italiana que notificadas editalmente não procederem à conservação/reconstrução do prédio.
Este edifício fora, em tempos de antanho, uma taberna com jogos tradicionais.
O quarteirão onde está a ser demolido este imóvel e onde está, também, o Centro Cultural é aquele que historicamente, em toda a zona baixa da Vila, mais nos confessa sobre a vida antiga do núcleo urbano barquinhense, local onde se privilegiou o comércio, a sua união com o rio, as suas vivências e até as suas cheias. É neste quarteirão que se perpetua os vestígios da nossa história cunhada de arquitectura e de urbanidade. É este quarteirão que nos conta que os barquinhenses viviam de frente para o rio e virados para sul, tradição olvidada num passado recente mas que, felizmente, está a renascer nas novas gerações para as quais o rio passou a ser um ponto nobre.
Neste quarteirão podemos vivificar as lajes de pedra calcária guarnecendo os pavimentos dos pisos térreos, vestígios da adaptação local à vivência das inundações que, frequentemente, e com a sua adversidade invadiam a Barquinha. Cheias que eram uma bênção, tal como no rio Nilo, pois com a fertilização dos campos nasciam os denominados “nateiros” nos quais se produziam abundantes cereais e produtos hortícolas.

Neste espaço urbano os pisos térreos eram ocupados com armazéns e comércio, quase sempre ligados à faina do rio. Um dos produtos mais comercializados era o Sal cujo topónimo deu nome à Rua (antiga Capelo e Ivens). Sabe-se que existiram dois importantes depósitos de sal, um no edifício da Família Pereira e outro no edifício da Família Condeço, edifício que foi agora destruído face à eminência de ruína.  

Publicado o livro sobre o Pe. Matias da Maia

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Não se pode duvidar que os Religiosos da Companhia de Jesus, que nos séculos XVI e XVII XVIII estabeleceram relações de cultura profícua entre Portugal e a Ásia Extrema.
O Tejo que acaricia o solo de Vila Nova da Barquinha e de Atalaia é o mesmo rio que viu partir.

Matias da Maia Pe. Matias da Maia. Terra natal: Atalaia; Ano de apostolado:1656-1667; Lugar do falecimento: naufragou; Sítio da sepultura: No Mar da China ... Matias da Maia viveu na China sua contemporânea uma época extraordinariamente conturbada de mudança de pessoas ligadas ao poder e de dinastias. É insigne a RELAÇÃO DA CONVERSÃO do Jesuíta nato em Atalaia, plena de vigor e rigor literário, pela força histórica do relato circunstanciado, dos acontecimentos presenciados in loco. A narração de Matias da Maia segue o esquema retórico clássico do seu tempo, ou seja, «a narratio, como componente da dispositio (parte da técnica retórica que se ocupava da organização global do discurso e da sua economia interna)» empregue pelo jesuíta «[…] desempenha, então, uma função marcadamente activa, de preparação da argumentação: “A narração, portanto, não é uma história (no sentido fabuloso ou desinteressado do termo), mas uma prótase argumentativa» que nos remete para eventos reais. Claro que a apódose da retórica de Matias da Maia será o panegírico dos trabalhos e sacrifícios efectuados em nome da religião cristã e da sua propagação, contudo respeitando sempre os detentores do poder:
«A Rainha, & a mãy delRey, apertáram daí por diante com o Padre que baptizasse o Principe, mas elle respondeu, que o nam faria sem elRey vir nisso, e prometer de o mandar aprëder as cousas da ley de Deos, tanto que tivesse idade, mas passaramse dous meses sem se tratar deste negocio. Adoeceo neste tempo o Principe mortalmente; vieram logo pedir ao Padre o encomendasse a Deos nas Missas, & perguntar, que julgava naquelle caso, respondeo o Padre: que Deos estava agastado contra elRey, pois tendolhe dilatado as esperanças do reyno naquelhe filho, com tudo se detinha em o mandar baptizar. Ouvindo elRey este recado no mesmo ponto mandou chamar ao Padre, & lhe disse, que baptizasse o Principe; o q o Padre loguo fez diante do mesmo Rey, & de todo o povo, pondolhe com as cerimonias costumadas
o nome de Constantino; & porque o nome de Constantino cõ dificuldade o pronunciam os Chinas, chamoulhe o Padre, Tamtim, que na lingua Sinica quer d zer: este he o que convem determinar; appellido, que elRey festejou muito, & nem elle, nem os do paço o nomeam por outro nome, senam pelo de Tamtim, que pode ser presagio de elle haver de ser o que determine levar por diante os bons principios de nossa santa Fè.»

Depósito legal 360510/13
ISBN 978-972-95634-7-8
Edição: Câmara Municipal de Vila Nova da Barquinha

A Aviação em Tancos, Vila Nova da Barquinha

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Tancos - Vista do Monte Dom Luiz
O Polígono de Tancos situa-se na freguesia da Praia do Ribatejo, concelho de Vila Nova da Barquinha e nele estão implantadas, atualmente, diversas Unidades do Exército Português: a Escola Prática de Engenharia, o Comando da Brigada de Reação Rápida, a Unidade de Aviação Ligeira do Exército e a Escola de Tropas Pára-quedistas. Foi aqui que, em 1907, surgiram os Serviços de Aerostação e no dia 10 de Março de 1910 tiveram lugar as primeiras experiências de voo com aeroplanos em Portugal. Assistiu  ao evento o rei D. Luís. Ainda hoje o monte que serviu de observatório mantém o seu nome. O voo de aeroplano aconteceu na carreira de tiro do polígono. O avião denominado Gomes da Silva II, de 6,75 metros de envergadura, com um peso de 185 quilos e equipado com um motor Anzani de 28 CV, montado em Tancos, deslocando-se para sul, fez várias tentativas falhadas devido às más condições da pista. O avião rolou umas dezenas de metros e veio a acidentar-se num talude ao lado da carreira de tiro e em consequência foi abandonado o projeto. Davam-se os primeiros passos na aviação em Portugal.
Em 1911 é criada a Companhia de Aerosteiros do Exército Português, em Vila Nova da Rainha que se torna a primeira unidade aeronáutica militar portuguesa. Mais tarde transformada em Batalhão de Aerosteiros, tinha por missão principal a operação de aeróstatos, sobretudo de balões de observação. Em 1912, a título experimental, são integrados no Batalhão de Aerosteiros os primeiros aviões, o primeiro dos quais, um Deperdussin B, nascendo assim a aviação militar portuguesa. Em 1914, é criado o Serviço Aeronáutico Militar e a Escola de Aeronáutica Militar em Vila Nova da Rainha (Azambuja), onde se mantém até 1920, junto do Batalhão de Aerosteiros.
Em 1918 é reorganizada a Aviação do Exército, passando a designar-se por Serviço de Aeronáutica Militar, integrando seis diferentes departamentos, entre eles a Direção de Aeronáutica, as Escolas Militares de Aviação e Aerostação, as Tropas Aeronáuticas (de Aviação e Aerostação) e o Parque de Material de Aeronáutica.
1918 é criada a Esquadrilha Mista de Depósito e Instrução, inicialmente em Alverca. Desejando-se deslocá-la para próximo do centro do país, por razões económicas, aproveita-se a carreira de tiro da EPE. Perto do monte D. Luís foi instalado um hangar desmontável, proveniente de Vila Nova da Rainha.
A primeira unidade operacional de aviação militar surge em 1919 na Amadora. Designou-se por Grupo Esquadrilhas de Aviação "República", Esquadrilhas de combate equipadas com 22 aeronaves Spad S VII-C1 e Esquadrilhas de Bombardeamento e Observação equipadas com 16 aeronaves Breguet Br 14 AZ. Neste ano é também adotada a Cruz de Cristo num círculo branco, como símbolo da Aviação Militar Portuguesa
Em 27 de Outubro de 1921 aterram em Tancos dois aviões Caudron GIII, pilotados pelos Capitães Ribeiro da Fonseca e Luís Gonzaga, inaugurando-se nessa data a Esquadrilha Mista de Treino e Depósito. O distintivo da BA.3, um galgo, é da autoria do Capitão Ribeiro da Fonseca, que se manteve até à sua extinção e que ainda, se pode vislumbrar, no portão nascente da unidade.
Em 1921 o capitão Luís Gonzaga que tinha sido agraciado com a Cruz de Guerra em França faleceria no dia seguinte durante as cerimónias oficiosas de criação da unidade, a Base Aérea n.º 3.
A sua primeira Ordem de Serviço data de 1 de Agosto de 1921.
Foi o berço da aviação de caça em Portugal, estando, por isso, na origem das mais longas tradições da aviação Portuguesa.
Em 9 de Setembro de 1923, foi inaugurado o primeiro Hangar. Em 1933, chegaram os primeiros aviões de caça da aviação Portuguesa: 3 FURY. A partir de 1 de Janeiro de 1939, por determinação do Ministro de Guerra, passou a chamar-se BASE AÉREA DE TANCOS, sendo seu Comandante o Major Craveiro Lopes, mais tarde Presidente da República. A 30 de Outubro de 1939, a Base Aérea, passou a designar-se por BASE AÉREA n. º 3. Em 1940, foram construídos os dois Hangares, ainda hoje existentes. Em 1951, foram inauguradas as Casernas, Refeitórios e a Estação Elevatória de Águas.
Em Julho de 1952, atingiu-se o maior número de aviões baseados na unidade: 108 SPITFIRES, HURRICANES, THUNDERBOLTS, etc. A partir desta altura, a missão da Base sofreu grandes alterações tendo-se tornado mais ampla e passando a abranger sectores muito diversificados na preparação do pessoal especializado, para fazer face às exigências da guerra do Ultramar. Com efeito, competia-lhe, por um lado, a formação dos pilotos de helicópteros, desde o seu início até à sua partida para o Ultramar, incluindo o estágio operacional de todos os pilotos de T-6 e DO-27; cursos de adaptação em plurimotores; apoio aéreo ao Regimento de Caçadores Paraquedista (depois Base Escola de Tropas Paraquedistas) na formação da totalidade dos cursos de tropas pára-quedistas e na manutenção do seu treino de saltos; cooperação com o Exército em apoio aéreo aos vários centros de instrução operacional; formação de observadores do Exército; transporte de evacuação sanitária em helicóptero, mantendo para o efeito tripulações e aeronaves em alerta; etc.
Por outro lado, conjuntamente com esta atividade, competia à BA.3 a instrução de todos os Oficiais, Sargentos e Praças da Polícia Aérea e ainda as Praças Condutores Auto, Sapadores Bombeiros, Amanuenses, Clarins e Auxiliares do Serviço Religioso.
Ao longo deste período dinâmico da sua história terá a BA3 atingido o máximo de atividade global contando com um efetivo de mais de 2000 homens, fazendo cerca de 1000 horas de voo por mês e assegurando a instrução terrestre a contingentes de 800/900 homens de 4 em 4 meses. Para além da recruta de pessoal da Força Aérea notabilizou-se a BA3 pela instrução de pilotos de Helicópteros e de Plurimotores, sem esquecer o apoio permanente às Tropas Pára-quedistas.
Como Comandantes, teve grandes vultos da aviação Portuguesa, entre os quais, para citar os mais antigos: Brigadeiro Ribeiro da Fonseca, Brigadeiro Sousa Maia e Marechal Craveiro Lopes.
Operaram na BA3, vários tipos de aeronaves:
COUDRON e MARTINSYDE em 1921/22;
MORANE e A VRO-ARDlSCO em 1927/28;
HAWKER FURY em 1933;
VIKER, POTEZ e WAWKERHIND em 1937;
GLADlATOR em 1939;
CUNTIN MOHAWK em 1944;
SPITFIRE e HURRICANE em 1947;
THUNDERBOLT em 1952;
CUB, MAGISTER, OXFORD e JU.52 em 1955;
T-33 em 1958;
DORNIER (D0-27) e HELICÓPTEROS ALII e ALIII em 1964/65;
T-6, NORD-ATLAS e HELICÓPTEROS SA-330 (PUMA) em 1965/70;
A partir de 1974 ALIII, CASA 212 (AVIOCAR) e CESSNA FTB-337G.
Pelo Decreto-Lei n.º 128/94, de 19 de Maio e na sequência dos diplomas de reestruturação das Forças Armadas, é extinta a Base Aérea n.º 3, da Força Aérea, sediada em Tancos, e, consequentemente, transferida para o Exército esta infraestrutura onde passou a funcionar o Grupo de Aviação Ligeira do Exército (GALE), Diário da República, nº 163 de 14 Julho de 1993. O GALE passa a partir de 1 de Julho de 2006 a denominar-se Unidade de Aviação Ligeira do Exército (UALE), conforme Diário da República n.º 115, II Série, de 16 de Junho de 2006, O Exército aguarda a chegada dos helicópteros NH-90, para em Tancos proceder à sua operação, sustentação e manutenção.









A inauguração solene do Aérodromo de Tancos. Nas imagens: o tenente aviador Dias Leite, que ganhou o 1º prémio de acrobacia aérea; os hangares do novo aérodromo; o capitão aviador Sarmento Beires, que realizou a melhor aterragem da cerimónia num aparelho Breguet, de 300 cavalos; a mulher de Ribeiro da Fonseca procedendo ao baptismo dum dos aviões, durante a cerimónia do dia 9 desse mês.


Ilustração Portuguesa, No. 917, September 15 1923 - 11

Estradas de neveiros em Vila Nova da Barquinha

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Ilustre amiga questionou-me se conhecia algo sobre o transporte de neve entre Vila Nova da Barquinha e a capital do reino, Lisboa de seu nome.
Como sou dado a desafios não olvidei tal questão e procedi investigações prévias, certo que meditação e a investigação fortificam a mente, e com a costumada prudência fiz-me ao caminho deixando aos outros a descoberta de renovadas pedras ciente que Plus vident oculi quam oculos” vários olhos vêem mais que um olho.
Interrogado o Sr. António Roldão, preclaro historiador local, pessoa com quem gosto de controverter os factos históricos da nossa terra, fiquei a saber que foi público até aos anos setenta, a presença de marco da estrada de neveiro entre Vila Nova da Barquinha e Segade, Miranda do Corvo. Mais, precisamente, o 2.º marco era fisicamente presente antes de chegarmos à cerâmica da Moita do Norte. A estrada seguiria pela Atalaia em direcção a norte. Em tal documento físico estavam inscritas as distâncias e as designações das duas localidades. Ainda, segundo o seu relato, tal marco estará depositado no antigo mercado municipal, à guarda do Centro de Interpretação de Arqueologia do Alto Ribatejo (CIAAR), de Vila Nova da Barquinha.
Redobrada a curiosidade iniciei a investigação sobre esta temática. Das buscas efectuadas foi possível apurar que já em “1619 - a Câmara de Lisboa fez contrato com Paulo Domingos, oficial de neveiro, que consistia em levar para a capital 96 arrobas de neve da Serra da Estrela para o fornecimento diário entre 1 de Junho e 30 de Setembro, a neve retirada ia em carros até à Barquinha” (1)
Fiquei surpreendido com a antiguidade do transporte do gelo, data de 1619, do(s) porto (s) da Barquinha para a capital. Um facto histórico sujeito à rigorosa investigação sobre a origem da Barquinha que, por agora, não poderei investigar.
Diz a história que terá sido Filipe II em finais de século XVI, ano de 1598 (?), a divulgar e instituir o hábito de saborear o gelado ou as bebidas geladas. Certo é que nem só da Serra da Estrela chegava o gelo à Barquinha. Tal produto era oriundo de várias localidades do reino como é exemplo o Coentral, localidade situada na serra da Lousã. Durante a invernia as gentes apanhavam a neve e depositavam-na em poços cobertos onde, depois de calcada, se conservava empedernida até ao Verão. Utilizando escadas de madeira as pessoas desciam ao fundo destes poços, com altura superior a dez metros, e à medida que neles iam sendo esvaziadas as cestas de neve os mesmos indivíduos calcavam-na com compactos maços de madeira ficando a mesma em pedra dura. O gelo era depois coberto com palha ou fetos, e isolado da luz solar, permanecendo em estado sólido até se proceder ao seu transporte. Numa primeira fase, em carros de bois, e numa segunda fase, em barcas, até à capital do reino. Tais blocos de neve ou gelo eram cuidadosamente circundados em palha ou fetos, mesmo em serapilheira ou, ainda, metidos em caixotes evitando a sua exposição à luz solar ou ao calor evitando a tudo o custo o seu degelo. 
Durante séculos o Rei e a sua Corte "regalavam-se" com doces e bebidas geladas.
Em carros de bois, pelos sinuosos caminhos das serras até ao porto da Barquinha, pelas designadas "estradas de neveiros” o gelo era transportado por via terrestre para depois seguir, pela via fluvial e pelo Tejo abaixo, até Lisboa.
Muita neve, certamente, se fundiria no transporte mas chegava com fartura à capital do reino ao ponto de o excedente ser adquirido pelo famoso Café Martinho da Arcada, no Terreiro do Paço.

     Anouk Costa, Cláudia Morgado, Marta Clemente, Rita Vale 2009



Estradas de neveiros em Vila Nova da Barquinha - (Continuação)

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Dizia eu no artigo ontem publicado que “Plus vident oculi quam oculos”, vários olhos vêem mais que um olho. 
Nem de propósito, hoje mão amiga da Armada, ramo das forças armadas que tenho especial afecto por razões profissionais, fez-me chegar o n.º 93, da REVISTA DA ARMADA, de Junho de 1979, que aborda a questão das estradas de neveiros e, essencialmente, o ofício (ou arte) dos neveiros e o transporte de gelo até à Barquinha / Constância.
Um artigo publicado, em 1979, pelo Dr. Herlander Machado, historiador, poeta, escritor e etnógrafo, que dou a conhecer no presente blog.

“Quando os gelados da corte eram feitos com neve da serra da Lousã-Coentral
O ofício dos neveiros
Neveiro era o ofício dedicado ao aproveitamento da neve para refrescar bebidas e fabricar doces gelados.
Parece ser muito antiga essa prática, devendo-se, porventura, aos árabes a iniciativa.
Em Portugal, o ofício dos neveiros terá conhecido o apogeu durante o século XVIII, mas há notícia da actividade dos contratadores da neve desde os princípios do século XVII. Efectivamente, a edilidade de Lisboa contratou, em 1619, com Paulo Domingues, o fornecimento diário de 96 arrobas de neve, desde 1 de Junho até 30 de Setembro. E teria sido a visita do monarca filipe III de Espanha a causa desse interesse da câmara de Lisboa. Tirso de Molina, autor dramático espanhol, que viveu de 1583 a 1648, escreveu no "burlador de sevilha", referindo-se a Lisboa: nieve da serra da estrela que por las calles apitos puesta sobre las cabazas la vendem …
Mas não só a Serra da Estrela forneceu a neve que se vendia em Lisboa. A casa real veio a consumir neve trazida da serra do coentral (próximo das vilas de castanheira de pera e da lousã). E também na serra da neve, de Alenquer e Montejunto, se faria sentir a acção dos neveiros. Este oficio manter-se-ia por largos anos com épocas de abundância e crises havendo dele notícias relativas a períodos sucessivos que atingem e até ultrapassam os meados do século XIX. Em rápido apontamento, salientaremos os seguintes factos: - em 1623, era neveiro da câmara de lisboa o italiano Marco António Cacilano. Em 1671 esse ofício estava a cargo de António Correia. Em 1683, era neveiro um tal Nicolau Vaz. Em 1699, o contratador da neve era o italiano João Baptista Rossati. Em 1717, foi Eugénio da Cunha o neveiro da casa real, mas, então, era outro - o sargento-mor Manuel de Abreu Henriques - o contratador da neve. A neve era disputada! E Lisboa assistiu ao conflito de interesses entre o fornecedor do paço e o neveiro das lojas da cidade.
Em 1724, era António de Almeida Lebrão o detentor do privilégio de fornecer a neve à casa real. Em 1733 e 1753 foram, respectivamente, contratadores da neve um tal marcos Álvares da Costa e uma francesa cujo nome era Catarina Picart. Contemporâneo desta era o neveiro Julião Pereira de Castro, de quem nos ocuparemos, em especial, nesta crónica.
Entretanto, cumpre dizer que nem sempre os neveiros conseguiram satisfazer as necessidades do consumo, chegando a importar-se neve de Espanha, enquanto, no alto das serranias portuguesas se orava para que nevasse, pois a recolha da neve se tornara ganha-pão para alguns dos pobres serranos.
Ainda existem, quase intactos, três dos sete poços construídos na serra do coentral, mais concretamente no cabeço do pereiro, hoje preferentemente conhecido por santo António da neve. São também localizáveis as ruínas dos poços desmoronados. E no vasto planalto, situado a 1200 metros (altitude que está bem próxima da que é atingida pelo monte do Trevim que, bem perto dali, constitui o ponto mais elevado de toda a Serra da Lousã) conserva-se, ainda, uma encantadora capela dedicada a Santo António. E, na sua fachada simples, destacam-se o escudo com a coroa real e duas lápides com inscrições ainda bem legíveis.
Alude uma das inscrições ao destino das esmolas que ali deixasse o caminhante - para beneficiações e conservação do templo.
A segunda lápide tem a inscrição que passamos a transcrever, depois de actualizada a grafia e de eliminadas as abreviaturas:
Esta capela do glorioso Santo António de Lisboa a mandou fazer Julião Pereira de Castro reposteiro do nosso reino da câmara de sua majestade e neveiro de sua real casa em terra sua ano de 1786.
Considerada a distância e recordadas as dificuldades de transporte nessa época, bem se podem imaginar os trabalhos e canseiras exigidos ao pessoal neveiro para, através de montes, vales e rios, fazer chegar às ucharias reais e aos botequins de lisboa a neve da serra do coentral.
Actualmente, é quase desconhecida a história dos neveiros.
E embora os poços e a capela de Santo António da neve já tenham aparecido, há anos, nos écrans da televisão, nem por isso foi então divulgada essa história pois o filme apenas foi apresentado como intermissão, sem palavras, com fundo musical ...
Os poços da neve tinham uma profundidade superior a uma dezena de metros. Exibem, ainda, o aspecto tosco das suas construções circulares e octogonais, cobertas por cúpulas abobadadas - tudo edificado com pedra negra, da região: uma só porta, estreita, constituía o acesso.
Utilizando escadas de mão, de madeira, os homens desciam ao fundo desses poços e, à medida que neles ia sendo despejada a neve, calcavam-na com pesados maços de madeira - como os dos calceteiros de hoje.
Empedernida, isolada entre os paredões alisados pelo estuque, coberta com palha, a neve conservava-se nesses amplos reservatórios até ao Verão, sem que uma réstea de sol lhe pudesse chegar.
Eram as mulheres e os garotos das aldeias vizinhas contratados à jorna, para acarretar cestas com neve para os poços.
Durante a maior rispidez da invernia, afadigava-se o mulherio e a garotada das redondezas na recolha do alvo lençol , caído no vasto planalto de Santo António da neve - quantas vezes, ao que se diz, só depois de muitas preces.
E, para reforçar a produção, as enxadas tinham rasgado previamente largos tabuleiros - as alagoas da tradição popular, onde a água ficava empoçada e acabava por se transformar em gelo.
Ainda hoje se podem localizar algumas alagoas, por entre lousas e urzes, mas a maior parte delas desapareceu quando, em 1971, foi ali construída uma pista para aviões.
Quando chegava o verão , a neve era cortada aos pedaços e vinha, em grandes blocos, para lisboa, envolvida em palha, fetos, serapilheira, ou, até, metida em caixotes. E, pelos tortuosos carreiros da serra, o transporte era feito em carros de bois. E desses grandes blocos de gelo - três ou quatro em cada carro de bois - muito se perdia pelo caminho.
Ao transporte terrestre - assistido por protecções legais, como as que obrigavam os povos dos múltiplos lugarejos encontrados pelo caminho a substituírem ou a repararem rapidamente as carroças danificadas e as que facilitavam a passagem nas portagens - seguia-se o transporte fluvial, a partir da Barquinha, ou de Constancia.
Muitos pormenores acerca da actividade dos neveiros andam, ainda, nas tradições populares da freguesia do Coentral onde, em 1956, aquando da publicação de uma monografia, denominada "Coentral, terra de encantos", pudemos recolher muitas informações junto dos que eram então os três únicos sobreviventes dessa época dos neveiros da região. Eram eles: Maria Lopes. Miranda (88 anos), Manuel Barata (84 anos) e José Lopes Agostinho (82 anos). E a casa do neveiro Julião Pereira de Castro - outrora a mais solarenga do Coentral - ainda lá se conserva, apesar de muito adulterada na sua traça por marcas do tempo e da incúria e também pelo mau gosto dos sucessivos proprietários.
E, ao que se diz, há na igreja paroquial do Coentral alguns paramentos e peças de talha policromada que lhe foram doadas pelo neveiro Julião Pereira de Castro. Em lisboa, a neve era vendida, à volta de 1780, no botequim da arcada do Terreiro do Paço, onde hoje se situa o café "Martinho da Arcada" .
Este foi sucessivamente conhecido por "casa da neve", "casa do café italiana", "café do comércio" e "café martinho" (nome do seu possuidor Martinho Rodrigues, que era, em 1810, contratador da neve do Coentral).
Esta casa tinha, então, um depósito de neve na Travessa da Parreirinha (próximo do teatro de S. Carlos).
Entretanto, outros estabelecimentos de Lisboa se tinham dedicado ao negócio da neve.
Segundo a "Gazeta de Lisboa", vendia-se neve, em 1792, no botequim da "Casa da Ópera" da Rua dos Condes e, em 1793, também esse produto natural se vendia no Largo do Rato, na loja de José Rodrigues Ferreira.
Já no século XIX, há várias alusões às lojas que vendiam neve, sorvetes e demais doces gelados ... Em S. Roque, vendeu neve o botequim do Tavares. No Rossio, eram servidos gelados na loja de bebidas do "Madre de Deus". E outros cafés e botequins, como o "Marrara", o "Minerva das sete portas", o "Toscano", o "Nicola" e o "Grego" venderam neve - uns desde o dia 1.º de Maio, outros desde o dia do Corpo de Deus, como se pode ver nos anúncios que já publicavam na imprensa.
Mas não só nos doces e nas bebidas era utilizada neve.
Também os doentes beneficiavam de tratamentos feitos com gelo.
Por isso, já em 1699 o neveiro João Baptista Rossati (um italiano) se propôs obter a concessão do privilégio para o fornecimento da neve a Lisboa obrigando-se, também, a abastecer o hospital de Todos os Santos.
Dois documentos do tempo de D. José I
Para a história dos "neveiros reais" e dos celebrados "poços da neve" do planalto de " Santo António da neve", da serra de Lousã-Coentral, têm inegável interesse dois documentos divulgados no "distrito de Coimbra" pelo Dr. Mário Ramos e recordados, no "Diário de Coimbra", alguns anos mais tarde (em 13-7-1936), pelo Prof. Virgílio Correia, da Faculdade de Letras de Coimbra. Aqui os transcrevemos:
Eu el-rei faço saber a vós, Sebastião José de Carvalho e Melo, Conde de Oeiras , do meu conselho, secretário do estado dos negócios do reino e que servis de meu mordomo mor; que Julião Pereira, neveiro da minha casa me representou que eu lhe fizera mercê do dito ofício por alvará de 23 de Junho de 1757, sem moradia nem ordenado, obrigação de dar a neve que fosse necessária todo o ano para a minha casa a preço de quarenta réis o arratel, em qualquer parte onde eu estivesse, como também à mais família dela pelo mesmo preço, para o que poderia tomar as carruagens, bestas e barcos, e tudo o mais que lhe fosse necessário para a condução da dita neve, a que se lhe não poria dúvida nem embargo algum, antes lhe teria dado todo o favor e ajuda que ele pedisse. E porquanto as justiças lhe duvidavam estes privilégios ao dito ofício concedidos, sem os quais não poderia, na forma das suas obrigações prontamente exercitar, me pediu lhos reformasse; ao que entendendo: hei por bem e mando a todos os oficiais de justiça, guerra ou fazenda guardem e façam guardar ao dito Julião Pereira, neveiro da minha casa todas as regalias, privilégios e isenções que concedi ao dito ofício, dando-lhe todo o favor e ajuda que ele pedir para o transporte da neve; e que com as pessoas que trouxer na sua condução não atendão, constando porém quais são, por certidão do seu mordomo-mor … Lisboa, 3 de Novembro de 1759.
Rei. Conde de Oeiras. Alvará de reformação de privilégios que V. Magestade manda se guardem a Julião Pereira, neveiro de sua real casa, na forma que acima se contém, e foi servido conceder-lhes com o dito ofício.
O segundo documento, firmado, dez anos após o primeiro, pelo neveiro Julião Pereira, estabelece o que segue: nomeio a simão Duarte e José Duarte, do lugar dos Poboraes, termo de Goes, para irem ajuntar neve à real fábrica que se acha no cabeço do Pereiro, serra da Lousã, e para esses avisarem os mais do lugar do Coentral para acudirem a ajuntá-la, por ficarem os ditos à vista da serra e verem quando cai a dita neve como também para irem ver a miúdo que não haja algum prejuízo na dita fábrica causado pelos pastores ou pessoas que passem, que não quebrem telhas dos telhados ou outro qualquer prejuízo para logo que suceda se prover de remédio e para o que lhe concedo todos os meus poderes que neste alvará que são concedidos para sua Magestade, para que em meu nome possam requerer a todos os ministros e oficiais de justiça e guerra ou fazenda, tudo o que preciso for para a boa conservação da neve da dita fábrica. Coentral, 29 de Janeiro de 1769 Julião Pereira.
No dizer do prof. Virgílio Ferreira, os "poços da neve" merecem pela sua construção e raridade ser considerados edifícios de interesse público ou, aproveitando a designação proposta por João José Paulo Pereira, no congresso (vi congresso beirão - 1936), incluídos no património comum. Entretanto, neste ano de 1979, verifica-se que ninguém procura salvar das garras do tempo e da incúria dos homens o que resta da "fábrica" dos neveiros no planalto relvado de Santo António da Neve, tornado parque de merendas e cenário de arraiais promovidos pela gente do Coentral. E o forasteiro, ao avizinhar-se da capela, deixa uma esmola e lê com curiosidade as inscrições existentes nas já referidas lápides: a esmola que os devotos do glorioso Santo António derem será aplicada para as obras da reedificação e ornamentos aos seus devotos o benefício.
Era assim ... in illo tempore.
Hoje, ocorre perguntar: - quem salva da incúria e da ruína o que resta da grande "fábrica da neve do cabeço do pereiro"? os poços da neve da serra da Lousã-Coentral, ali situados, a dois passos do Trevim (o ponto mais elevado da serra) bem merecem o interesse de quem de direito, para que se salvaguarde este património histórico que, se não tem interesse artístico, constitui um valioso testemunho e recorda interessantes páginas da nossa história - que nos cumpre preservar e divulgar para que se guarde memória junto das actuais gerações e para que o labor e as tradições do passado cheguem ao conhecimento dos vindouros.
Herlander Machado


In REVISTA DA ARMADA, n.º 93, de Junho de 1979. 

A neve e o porto da Barquinha

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“Existiu, em tempos que lá vão, do porto da Barquinha até Segade, uma estrada denominada dos neveiros, percorrida e sentida pelos mercadores que faziam da actividade do transporte da neve até ao nosso porto ribeirinho, o seu modo de vida acidentado. Segade era, e é, um pequeno povoado do Concelho de Miranda do Corvo, onde o carregamento inicial era feito, por razões de comodidade, supõe-se, visto que os poços de recolha da neve, para esse efeito, situavam-se um pouco mais além, em plena serra da Lousã. Já iremos abordar, documentalmente essa questão. A importância desta rota dos neveiros tinha a sua própria visibilidade nas preocupações das justiças concelhias, a dar fé à circunstância de se achar assinalada por meio de marcos indicadores do seu preciso trajeto, o que pode justificar, também, a existência secular desse fenómeno extraordinário do transporte da neve a tão grande distância. Havia um desses marcos, erguido desde o início dessa rota (creio eu) nas proximidades da defunta cerâmica do Moinho de Vento. Era o segundo desse percurso, visto que o primeiro achava-se levantado dentro da nossa vila, ali mesmo ao lado do Ferro de Engomar, (como se dizia no passado) ligeiramente acima do chafariz. Ali era o início da celebrada estrada dos neveiros, a partir do Porto da Barquinha. O primeiro troço contava-se até à cerâmica, e o marco que orgulhosamente o assinalava ostentava, em caracteres legíveis para o viajante, a legenda “ Barquinha a Segade”.
O alargamento da estrada processado há uns anos atrás, obrigou à sua remoção. Por motivos de facilidade, de desprezo e de afrontamento às virtudes do património concelhio, atiraram-no para o valado. Do mal, o menos! Ali dormiu sestas e sestas, noites de geadas e de luares, como inutilidade oficial.
Tive a tentação de o levar para o meu pequeno jardim, resguardando-o de vandalismos e de cobiças, mas entendi, que, fazendo parte do património e das memórias históricas desta terra, o melhor seria questionar os donos do poder local da época, chamando-lhes a atenção para lhe darem destino certo e coerente. Assim o fiz e assim o fizeram os governadores de então.
Para onde? Não sei! Ainda agora podem ser vistos os sulcos deixados no valado pelos rodados do dumper que o transportou.
O marco, entretanto, levou sumiço. Procurei-o, agora, por espirito de curiosidade, no babilónico depósito dos espólios patrimoniais da arqueologia local, sem sucesso. Repousam lá, graças a Deus, alguns outros marcos delimitadores das fazendas da Ordem de Cristo nos montes do concelho, postos a descoberto por um incêndio Florestal, há uns anos atrás. Fiz idêntica diligência no actual parque de viaturas da Câmara Municipal e outrora depósito provisório de pedras velhas e antigas, úteis e inúteis, sem melhor resultado. O marco deve ter sido alvo do camartelo municipal, à semelhança do que aconteceu aos pelourinhos dos extintos concelhos da Atalaia e de Tancos, procedimento reprovável de uns autarcas do século XIX, acto merecedor de palavras duras e desassombradas do Dr. Xavier da Cunha. Hei-de falar, sobre o assunto, proximamente.
Essa estrada dos neveiros não era nenhuma ficção, se bem que o pareça pelo extraordinário das suas memórias. Alexandre Herculano, nomeado comissário régio para a inventariação do património documental do País, disperso, abandonado e a saque nos cartórios dos extintos conventos, inicia a sua peregrinação precisamente no Porto da Barquinha, no dia 14 de Junho de 1853. Curiosamente, a comitiva faz-se a caminho a cavalo, como meio de transporte convenientemente indicado para o vencimento dos escolhos e dificuldades dos locais a percorrer.
A comitiva quando chega à Lousã, desloca-se à serra, provavelmente em demanda de um conventinho ali perdido e é então que depara com os poços nas proximidades, destinados à recolha da neve. Fixemos as impressões de Herculano, no dia 20 de Julho:
“Viagem à serra da Lousã. Ajunta-se a caravana na aldeia do Fiscal, nas faldas da serra. Vista cortada pelo nevoeiro para o norte. Passeio até à montanha da neve. Os depósitos – uma ermida; absurdo de um templo no cume de uma montanha. As duas montanhas estão unidas por uma lomba de onde nascem duas ribeiras em sentido oposto para poente e nascente e que divide os três concelhos de Lousã no noroeste e norte, o de Góis ao nascente e o de Figueiró ao sul e sudoeste. As montanhas só de mato rasteiro. Os poços de neve num recôncavo: como se vai derretendo em volta dos poços e dando uma fonte perene: como a apanham mulheres: chegou este ano em Fevereiro, a 14 pés de altura no recôncavo. É transportada em carros para a Barquinha. Modo singular de descerem os carros com mato do alto da serra: o juntar no barracão junto ao poço e o sorvete preparado ali.” Este episódio ilustra a funcionalidade do sistema, ainda nessa data, com as características e condicionantes próprias de um transporte tão específico. Específico e enigmático nos processos de transporte de tão preciosa e delicada carga, ao longo de tão larga distância. Dificilmente se percebe, ainda hoje, que técnicas, que saberes estavam ao alcance desses mercadores, para lhes permitirem, com inteiro sucesso, a ousadia de conduzir a neve até ao porto da Barquinha. Mas, mais desconcertante do que os desafios do transporte tão complicado e moroso a partir da Lousã é o de uma nova e impensável rota, esta da Serra da Estrela, desde a Covilhã e bastante mais antiga, no princípio do século XVII, e, espanto dos espantos, tem o porto da Barquinha como destino e ponto convergente de embarque fluvial para Lisboa!!!
As notas deste documento, recolhidas através do sistema de informação para o Património Arquitectónico (Núcleo Urbano da Covilhã) dizem o seguinte: “1619 – A câmara de Lisboa faz contrato com Paulo Domingos, oficial de neveiro, que consistia em levar para a capital, 96 arrobas de neve da Serra da Estrela para o fornecimento diário de 1 de Junho e 30 de Setembro; a neve retirada ia em carros até à Barquinha e daí em barcos até Lisboa, onde era guardada em poços, havendo um junto do convento da Graça e outro no Castelo de S. Jorge.”
A particularidade dos locais de recolha em Lisboa, demostra quão valioso era o produto, a raridade do acesso ao seu consumo, transformado em sorvetes, e, por certo, só acessível a gente de algo no início do seu aparecimento e comercialização, na capital do reino.
A Enciclopédia Luso Brasileira, tomo 18, página 670, refere este sucesso de 1619, preferindo a designação de Domingues em vez de Domingos como oficial neveiro e acrescentando a informação com a nota de que um facto tão relevante estaria relacionado com a vinda de Filipe III a Lisboa. Dizem as crónicas, a documentação conhecida, que a moda do sorvete terá surgido em Lisboa a partir deste episódio, importada de Itália. A novidade alargou-se em clientela nos finais desse século e no seguinte, de tal modo, que sendo a procura significativa,
deu origem ao aparecimento do negócio da neve. O oficial neveiro, o homem que no cimo da pirâmide manipula o processo, dá corpo a uma prosperidade que mobiliza muita gente, em torno da profissão. O sucesso garantido exige a busca de soluções e a procura de novas fontes de abastecimento.
A estrada dos neveiros da Barquinha é a resultante dessa imperiosa necessidade e terá surgido, nos finais do século XVII, quando a vulgaridade do sorvete atinge uma popularidade e uma dimensão lucrativa apreciável. Este singular negócio da neve, que teve, desde sempre, o porto da Barquinha como centro convergente, por razões ponderosas que nos escapam, levanta algumas pertinentes interrogações.
A primeira das quais e a mais ambiciosa de todas elas é a de que, ao contrário do que sustentam alguns autores, a Barquinha não foi um parceiro menor em importância, relativamente aos seus vizinhos, desde quando é conhecida como povoado.
O seu natural crescimento não é casual mas sustentado por condições de acessibilidade e por uma geração de povoadores com os olhos bem abertos e despertos para as potencialidades e oportunidades dos negócios da auto-estrada do Tejo.
O cruzamento da informação atesta essa realidade em três ou quatro episódios sequenciais.
O primeiro, em 1615, data do crisma de cinco crianças da Barquinha. 1619, a neve recebida das faldas da Serra da Estrela. 1620, segundo Jorge Gaspar (1972) num trabalho de investigação apontando a Barquinha, entre outras, como das povoações que asseguravam o abastecimento de Lisboa. 1625, um casamento realizado na Ermida de Nossa Senhora do Reclamador,  atestando a vitalidade de uma povoação de cristianas raízes.
Afinal não somos tão novos como o pretendem nem tão pouco importantes como povo ribeirinho.”

António Luís Roldão

Artigo publicado no Jornal Novo Almourol - SETEMBRO 2013 | n.º 389

Os Autos da Barquinha - Gelo por Sal (De Emílio Miranda)

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 “Tagus, Tejus, Tejo.
Muitos nomes, um mesmo rio.
Fenícios, Cartagineses, Romanos e Árabes rasgaram as suas águas, fazendo dele uma estrada de eleição…
(...)
A história do Tejo é uma história milenar de que a maioria dos mortais apenas pode fazer vagas suposições, muitas delas baseadas no saber adquirido pela experiência de ver os elementos a interagirem com o rio e com a terra. Ao longo de séculos, os homens sulcaram as suas águas, fintado a sua braveza, servindo-se do obstáculo que constitui para definirem fronteiras e barreiras contra exércitos, inimigos ocasionais e todo o tipo de perigos, alguns mesmo imaginários. E esse conhecimento dá-lhes às vezes a ilusão de que o compreendem, de que conhecem as suas manhas, mas a verdade é que a vontade do Tejo e os seus caprichos são insondáveis.”
Será verdade que o caminho-de-ferro viria para ditar a morte do rioTtejo?
Para descobrir o encantamento deste livro é fundamental quer recuemos no tempo.
O Tejo era a fronteira. Dum lado começava o norte e do outro iniciava-se o sul. Daí a nossa região estar marcada por fortalezas militares singulares (Ozezere, Almourol e Cardiga) marcadas por um intercâmbio dominado na faina fluvial pelas embarcações. O Tejo sempre foi além de fronteira natural, um corredor de comunicação entre as terras altas e as terras baixas.
Ainda hoje, em Vila Nova da Barquinha, se podem vislumbrar os antigos poiais e escadas, sempre mais altos do que o normal curso de água para evitar a sua entrada no interior dos armazéns. A zona do Centro Cultural é a que mais confessa sobre a vida antiga do núcleo urbano barquinhense, local onde se privilegiou o comércio, a sua união com o rio, as suas vivências e até as suas cheias. É neste quarteirão que se perpetua os vestígios da nossa história cunhada de arquitectura e de urbanidade.
Neste quarteirão podemos vivificar as lajes de pedra calcária guarnecendo os pavimentos dos pisos térreos, vestígios da adaptação local à vivência das inundações que, frequentemente, e com a sua adversidade nos invadiam. Cheias que eram uma bênção, pois com a fertilização dos campos nasciam os denominados “nateiros” nos quais se produziam abundantes cereais e produtos hortícolas.
Neste espaço urbano os pisos térreos eram ocupados com armazéns e comércio, quase sempre ligados à faina do rio. Os fluxos comerciais entre as Beiras, e Lisboa faziam-se, principalmente, pelo rio, levando e trazendo permanentemente produtos que aqui eram transbordados, comercializados e levados do e para o interior dos territórios adjacentes, como é exemplo o sal, o azeite, as madeiras, a retrosaria, o gelo etc.
 “ O gelo - amontoada em pequenos montículos será depois acartada em cestas, às costas, até ao poço de gelo mais próximo. Nada é deixado ao acaso, para que o gelo resultante seja da melhor qualidade. Limpo, cristalino e sem impurezas. Liberto de gostos e dissabores …
Há que arrebanhar a maior quantidade possível de neve enquanto se mantém solta e límpida, e depois guardá-la naquelas cavidades profundas, onde será compactada até se transformar em gelo. Tapado por palha e fetos, o gelo permanecerá ali até ao final da primavera, início do verão, altura em que será então cortado em grandes blocos e transportado em carros de bois, pela serra, até Constância e Barquinha de onde embarcará em barcaças, rio abaixo, desta feita até Lisboa, aos armazéns do Martinho da Arcada, e outros de menor nomeada, para deleite de senhores e senhoras”.
O Sal - Os soldados romanos chegavam a ser pagos em sal, de onde vêm as palavras “salário”, “soldo” (pagamento em sal) e “soldado” (aquele que recebeu o pagamento em sal). Na Idade Média o sal era conhecido como “ouro branco”. Ouro por ser o tempero mais usado nos alimentos. O sal vinha da foz do rio Tejo.
Descarregado o gelo, e de modo a rentabilizar o frete, é carregado o sal, chegado das salinas vizinhas da capital, sobretudo de Alcochete, onde é de excelente qualidade,
rumando desta feita até ao interior do reino, acondicionado em sacas de serapilheira nos porões das mesmas barcaças…”
Era um dos produtos mais comercializados cujo topónimo deu nome à nossa Rua do Sal, aqui mesmo ao lado. Sabe-se que na Rua do Sal existiram dois importantes depósitos, um no edifício da Família Pereira e outro no edifício da Família Condeço.
Há a magia de uma história que nos narra a presença dos franceses na 1.ª invasão, a sua passagem pelo Zêzere e a chegada a Tancos.
A sua obra está cheia de obscurecidas personagens, plena de sentimento de pertença e intemporalidade.
O percurso ficcional e verídico dos acontecimentos interligam-se com o humanismo e o sonho das suas personagens, desde as trincheiras nas terras da Atalaia até à fuga de barco para o outro lado do Tejo, para os lados do Arrepiado, ou dos amores dos homens do rio.
Desde o retrato da Vila de Tancos, à época, com o apogeu comercial em contraste com os armazéns vazios aquando da chegada dos franceses que tudo pilham.
… Não esquecem os mais velhos as histórias que falam do tempo em que ao Arripiado se refugiaram os da outra banda, quando os franceses invasores chegaram a Tancos para pilharem e incendiarem teres e haveres; abominável realização, a da guerra. Melhor seria se a cobiça se transformasse em festa e a fraternidade em alimento da alma. Àquele rossio acodem diariamente dezenas de carros e carroças, puxados por mulas, cavalos e juntas de bois em busca do que se torna necessário nas povoações do interior, e que chega em embarcações que sobem e descem o rio: as provenientes das terras altas cruzam-se muitas vezes com as que chegam de Santarém, Vila Franca e Lisboa. Mercadorias passam de mão em mão, são carregadas e descarregadas, transacionadas enquanto o diabo esfrega um olho. Notícias e rumores circulam: o rio é um pasquim, e, o mundo, um circo, um local mágico de invenções e exageros”
Emílio, narra-nos a parte violenta, a chegada dos Franceses à Barquinha. Aqui vão encontrar a resistência possível. Em ficção, coloca barquinhenses de hoje, no tempo das invasões francesas. Homens de Atalaia com afectos e histórias de vida, com sentimentos de dor, de suor e de lágrimas, que vêm a chegada do invasor que tudo assola: os sonhos, as terras e o próprio sustento.
O drama de Benilde, a filha do moleiro, que se apaixonou pelo invasor francês e que, descoberta a relação amorosa de ambos, veio o seu amado a ser chacinado pelo povo de Tancos.
O mistério das Mortes Ramiro e Roberto, que afinal incomodam muita gente!
A relação do médico Dr. Ambrósio com a Rosa-dos-Ventos, a curandeira, as tascas, os caminhos, as fontes e as pontes.
Prende-nos à narrativa a dinamismo das personagens. Uma linguagem singela onde os valores morais de alguns personagens alcançam crueza intemporal. É um romance emocionante, intuitivo que nos absorve e nos ensina a respeitar, ainda mais, os nossos antepassados e nos dá a conhecer a dureza dos trabalhos no rio. A construção da Ponte da Praia do Ribatejo, a primeira ponte ferroviária do país, no tempo de el rei D. Pedro V. A obra atrai-nos às lembranças dos nossos antepassados, às velas brancas, esvoaçando pelo límpido rio Tejo abaixo, em cujas margens, cobertas de canaviais, acena um alto bosque de choupos pretos. Recorda-nos a grande azáfama e atividade da Vila onde ecoavam os sons dos malhos de construção de barcos e os ásperos berros dos barqueiros, a confusão  dos atos de comércio onde homens se apinhavam, os pequenos barcos na margem, as mercadorias que iam embarcando para o fornecimento de Lisboa, as mulheres a lavar à beira do rio.
Gelo por Sal
Tantas histórias e tantas memórias!

Quem quiser ler que leia, pois o Tejo, pela mão do Emílio, conta orgulhoso a sua história!

Castelo de Almourol

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Castelo de Almourol (1830?)
Transcrição do Arquivo Pittoresco, Semanário Ilustrado, Vol. I. 1857-1858

 “O castello de Almourol, cujas ruínas representa fielmente a nossa gravura, é edificado sobre um fragoso ilheo, de forma oval, surgindo do seio do cau­daloso Tejo, a pequena distancia da antiga villa de Tancos, e a cerca de dezoito legoas da capital.
Foi este castello construído, ou, para melhor dizer, reedificado, por D. Gualdim Paes, primeiro mestre da ordem do Templo em Portugal; e por consequência a sua fundação deve ser, pelo menos, anterior alguns annos a 1195, porque neste último faleceu aquelle valorosíssimo cavalleiro.
Espanta como, apesar de abandonada desde tempos immemoriaes, esta elegante fabrica se conserva ain­da no estado em que a vemos; e admira ainda mais que tão pitorescas ruinas não tenham sido de algu­ma sorte aproveitadas, quando seria fácil até construir-se ali uma residência de verão, acastellada, que não teria inveja a nenhuma d'aquellas de que justamente se ufanam as deleitosas margens do Rheno.
Não é isto, porém, o que mais deve agora impor­tar-nos; e por isso, sem mais preâmbulos, passare­mos desde já a dar uma ideia succinta do estado actual d'este notável monumento, aproveitando para esse fim, resumindo-a, a excellente noticia que devemos á erudila penna do sr. conde de Mello. (1)
Olhando do occidente para o castello, descobrem­-se-lhe na cêrca exterior das muralhas, quatro torres circulares, collocadas a distancias eguaes, e mais ou menos derrocadas, sobrepujando um pouco a cortina que entre si as liga.
No meio d'esta e entre a segunda e a terceira tor­re, depara-se com a primitiva porta do castello, hoje inútil, a qual é de forma gothica, terminando em ogi­va, e de pequenas dimensões. Superiormente a esta porta e embutida na parede, vê-se uma grande la­pida, em que se distinguem alguns caracteres; mas a escriptura está em geral tão sumida e apagada, que é impossível decifrá-la.
No meio do recinto ergue-se a torre de menagem, coroada de ameias, em parte bem conservadas. Se­guindo pelo lado que deita para o sul, encontra-se um pedaço de muralha, dando mostra de que alli existira outrora um caes.
Da parte do oriente as ruínas apresentam um aspecto mais formoso e variado. Continua a cêrca exterior, mostrando agora cinco novas torres da mesma forma que as quatro primeiras, sendo ao todo nove as que abraçam e defendem o recinto exterior. A par da torre de menagem, que d'este lado tem duas ja­nellas, se eleva outra torre quadrada, e depois o pri­meiro recinto da fortaleza, que também d'ahi se des­cobre, porque a muralha levanta-se a grande altura torneando a torre de menagem; mas sem· regularidade nos lanços, pois os sujeitaram n'esta parte ás sinuosidades do terreno.
No ilheo desembarca-se do lado do norte, e d'esta parte está elle todo coberto de choupos e salgueiros. Havia aqui um caminho regular para o castello; mas esse caminho acha-se obstruido de pedras, e é for­çoso, querendo-se penetrar no edifício, aproveitar uma abertura que existe entre a terceira e a quarta torre.
Entrando-se de feito por aqui, encontra-se o obser­vador em um pateo interior do castello; uma porta que deita para este pateo, e communicava indubita­velmente com os aposentos dos andares superiores, está murada; provavelmente por terem desabado ou estarem ameaçando ruina aquelles. Sobre esta porta, que também termina em ogiva, vê-se um escudo de pedra, um pouco mais branca que o resto do edifício.
Por algumas fendas que existem nas paredes, e pelas poucas e esguias janellas que deitam para esta área; se póde conhecer que os aposentos rematavam em abobada; e pelo que d'ellas resta se vê egualmente que deviam ser ornadas de ricas laçarias; nenhuma, porém, se conserva inteira n'este plano, o que é realmente muito para lastimar.
Da obra de Gualdim Paes nada mais resta hoje: mas pelo que existe pôde affirmar-se afoutamente que foi acabada com singular esmero e que alli trabalharam sem dúvida os melhores artífices que então viviam em Portugal; aliás não teria resistido tantos seculos ás injurias do tempo, e á incúria dos homens.
De situação d'este castello quasi a meio do rio, da constituição geologilica do ilheo, e por ventura da valente construção das muralhas da velha fortaleza nasceu o pensamento de fazer passar sobre elle a ponte, na qual se ha de assentar a via ferrea que deve ligar o caminho-de-ferro de leste, na secção de Lisboa a Santarém, com a linha que atravesse a província do Alemtejo em direcção a Elvas e Badajoz. N'este caso, o ilheo e castello formariam como que um gigante encontro natural d'aquella grande obra.
Sem de modo algum nos oppormos a que sejam aproveitadas convenientemente as vantagens que para semelhante fim proporciona a posição do castello de Almourol, já daqui rogamos encarecidamente a quem entender sobre este objeto, que as venerandas e poéticas ruinas sejam poupadas e reparadas.
Que os viajantes estrangeiros quando percorrerem no futuro aquela importantíssima linha, não hajam de presencear mais um acto de indesculpável vandalismo. Ao lado d'essa grande conquista do progresso, deixem existir ao menos, sem o profanar, o bello monumento do valor e heroicidade de nossos maiores”.  

(1)         Jornal das Bellas Artes, 1.ª serie, n.º 3, tomo 1, janeiro  1858 (?) - - litografia de: MELO, Conde de, 1801-1865, Ruinas do castello d'Almorôl, sobre o Tejo [Visual gráfico / Conde de Mello copiou do natural ; Franco lith.. - [Lisboa?. : s.n., ca. 1830?] ([Lisboa] : Off. R. Lith. - 1 gravura : , Data atribuída segundo o período de actividade da impressora. - Dim da comp. sem letra: 12,2x16,6 cm (comesquadria) - Biblioteca Nacional

Dia 13 de Junho de 2014, pelas 15h, no Centro Cultural da Barquinha, lançamento do livro: "Barquinha - Crónicas históricas", de António Luís Roldão

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        Nota de abertura
A cultura e a educação têm sido áreas que, entre outras, consideramos essenciais para o interesse dos munícipes. Com esta iniciativa pretende-se, uma vez mais, contribuir para a divulgação do território, da nossa história, da vivência dos espaços e do património legado pelos nossos antepassados, temas que carecem de ser valorizados e aprofundados.
Sabemos que o nosso futuro não está assegurado só pelo facto de ter uma história e uma identidade muito claras e precisas, mas sim pelo compromisso, pelo labor e pela aposta de cada pessoa e instituição. Todos devemos aditar algo ao legado que os nossos antepassados nos transmitiram, colocando o saber e empenho ao serviço do interesse colectivo, ajudando com confiança a construir um futuro melhor para a nossa comunidade.
Apesar da existência de algumas investigações sobre Vila Nova da Barquinha, resta ainda um longo caminho a calcorrear para descobrir a génese desta terra e da sua história, havendo aspectos apaixonantes para mistificar e desmistificar. 
A insipiência das circunstâncias concretas da sua origem, e não esclarecimento dos factos históricos subsequentes, devem-se a problemas relacionados com a ocupação do solo e ordenamento do território na terminologia de hoje, bem como à destruição de fontes pela revolução francesa e, certamente, à incúria dos homens. 
Os primórdios da nossa história passam, obrigatoriamente, pela história do rio Tejo e pela fundação da nacionalidade. 
É junto do Tejo que existem os primeiros povoamentos pois este é um dos rios mais utilizados pela ocupação humana em tempos remotos em toda a Península Ibérica, como prova a descoberta na ribeira da Atalaia de vestígios de instrumentos líticos que vão do Homem de Neandertal (300 mil anos), ao Homem Moderno (24 mil anos). 
Este rio sempre foi, além de fronteira natural, um corredor de comunicação entre as terras altas e as terras baixas, um símbolo de grandeza e de missão histórica de Portugal. Nas suas margens encontram-se o castelo de Ozêzere, o castelo da Cardiga e o castelo de Almourol, todos eles com papel essencial na reconquista cristã. Gualdim Pais, o grão-mestre dos templários, fez deste território o centro nevrálgico da expansão de Portugal.
O mesmo rio e território outrora defendido pelos gloriosos templários, as caravelas de Frei Gonçalo Velho - comendador de Almourol e da Quinta da Cardiga – que aqui foram construídas e navegaram por mares nunca dantes navegados, iniciando pelo mundo a maior epopeia portuguesa de que há memória. 
Um rio que fez dos homens artífices, pescadores e comerciantes. 
Um rio que influenciou todo o traçado da urbe que foi a matriz a partir da qual se estruturaram as outras ruas desta vila. 
Uma região que se afirmou na história de Portugal devido à sua importância estratégica pelo atravessamento de boas vias de comunicação, de que são exemplo as vias romanas e as estradas reais. 
A história da Barquinha é, também, a história do caminho-de-ferro que superou as estradas e a via fluvial, até então predominantes. 
A história da Barquinha é, ainda, a história de três concelhos outrora prósperos - Atalaia, Tancos e Paio de Pele - que se dissolveram, enfim, num só, em 6 de Novembro de 1836. 
A história da Barquinha é a criação de unidades militares por onde passaram milhares de cidadãos no cumprimento do dever militar. 
Muito falta por narrar e dar a conhecer desta terra banhada pelo rio Tejo, essa via civilizacional que, ora em correria, ora em mansidão, nos acompanha na longa jornada de séculos. 
Importa recordar os duros tempos de antanho para ir buscar força e alento ao exemplo dos nossos precedentes por tudo o que fizeram em prol de Portugal. 
Os desafios agora são outros! Dir-me-ão. É verdade! Todavia, sabendo como os nossos antecessores reagiram no passado estamos mais capazes de enfrentar as dificuldades e os escolhos da vida. 
Estamos cientes que muita da nossa história local ainda está por fazer, mas hoje ficamos mais ricos e este estado de alma devemos, decididamente, ao empenho, dedicação e investigação deste grande barquinhense, António Roldão.

Fernando Freire, Presidente da Câmara
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