Com a publicação da Lei de Separação da Igreja do Estado, de 20 de Abril de 1911 (1) surgem as Comissões Concelhias de Inventário com a tarefa de, em cada concelho, proceder ao arrolamento de todas “as catedrais, igrejas e capelas, bens imobiliários e mobiliários que têm sido ou se destinavam a ser aplicados ao culto público da religião católica e à sustentação dos ministros dessa religião e de outros funcionários empregados e serventuários dela, incluindo as respectivas benfeitorias e até os edifícios novos que substituíram os antigos” ( art.º 62.º da referida lei).
A lei não obrigava a que existisse uma avaliação e imposição de selos, mas tão só que se entregasse os bens móveis de valor cujo descaminho se temia à guarda das juntas de paróquia ou remetendo-os para os depósitos públicos ou para os museus.
Tal arrolamento era feito, conforme estipulava no art. 63.º “ (...) administrativamente, de paróquia em paróquia, por uma Comissão concelhia de inventário, composta do administrador do concelho ou do bairro e do escrivão da fazenda, que poderão fazer-se representar por empregados seus, sob sua responsabilidade, servindo o primeiro de presidente e o segundo de secretário, e por um homem bom de cada paróquia, membro da respectiva junta, e indicado pela câmara municipal para o serviço dessa paróquia.” Continuando, no art. 64.º refere-se que “quando o governo o entender necessário, poderá designar mais de uma comissão para o mesmo concelho ou bairro, ou nomear para qualquer delas outros funcionários além dos indicados no artigo anterior.” Pelo art. 65.º “a comissão poderá reclamar o auxílio de qualquer autoridade pública e todos os elementos de esclarecimento de que careça e deverá requisitar da respectiva comissão regional artística, ou escolher por si, um ou mais peritos de reconhecida competência, quando presumidamente se tratar de móveis com valor artístico ou histórico”.
Estas “comissões concelhias ficam directamente subordinadas ao Ministério da Justiça, onde será criada e exercerá atribuições de superior direcção e administração, uma Comissão central de execução da lei da separação, composta de funcionários do Ministério, administrativos ou fiscais, e de magistrados ou empregados judiciais, e do Ministério público, da escolha do ministro.” (art. 66.º). Determina-se que os inventários deveriam começar no dia 1 de Junho de 1911 e terminar no prazo de três meses, sendo feitos em duplicado, ficando um exemplar na câmara municipal à disposição de quem o quisesse examinar, e o outro seria enviado à Comissão Central de Execução da Lei de Separação pelo administrador do concelho, à medida que terminassem os trabalhos relativamente a cada paróquia (art. 67.º). Do auto de entrega de 10 de Janeiro de 1931, constam todos os bens móveis arrolados da freguesia de Atalaia. O administrador do concelho entregava à corporação cultural e esta declarava, no competente auto de entrega, que se responsabilizava pelas despesas anuais com a guarda, conservação e reparação dos bens que recebia, ficando obrigada a apresentar ao Ministério da Justiça e dos Cultos um duplicado do referido auto de entrega, no prazo de três meses. Deste auto de entrega relevo os seguintes bens, entre outros, que estavam na Igreja da Atalaia:
- Imagem de N.S. da Assunção, padroeira da freguesia da Atalaia;
- Imagem de N.S. do Rosário;
- Imagem de S. António;
- Imagem do Menino Jesus;
- 2 quadros em tela (N.S. da Piedade e S. Sebastião).
Na Capela do Senhor d’Ajuda, Atalaia:
- Imagem do Senhor d’Ájuda (Cristo crucificado)
- Imagem de N.S. Ajuda;
- Imagem de S. António;
- Imagem de S. José;
- Imagem de S. Caetano.
Na capela da Moita – N. S. Remédios:
- Imagem de N.S. dos Remédios;
- Imagem de N.S. do Carmo;
- Imagem de S. José;
- Imagem de S. Amaro;
- Imagem do Menino Jesus;
- 1 quadro de Cristo crucificado em madeira;
- 1 quadro do Senhor dos Passos em tela
Na Capela de S. João Batista das Vaginhas (Entroncamento):
- Imagem de S. João Batista;
- Imagem de N.S. Conceição;
- Imagem de N.S. Lourdes;
- Imagem do Menino Jesus;
- Imagem Senhor Aflitos (Cristo crucificado)
Na Capela de S. Caetano (Cardiga):
- Imagem de S. Caetano;
- Imagem do Menino Jesus;
- 1 quadro de N.S. da Paz (em madeira);
- 1 quadro em tela.
Curioso é descobrir que, neste auto de entrega, a Casa da Irmandade e as dependências da Igreja da Atalaia foram destruídas aquando das obras de restauração de 1939. Todos estes bens, constantes do auto de entrega, imóveis e móveis, foram-no em uso e administração, conforme art.ºs 10° e 11°, do Decreto-lei no 11887, de 6 de Julho de 1926. Todavia, as entregas móveis e imóveis foram convertidas em propriedade da Igreja, nos termos do art.º 44.º do Decreto-Lei n.º 30615, de 25 de Julho de 1940, com excepção da Igreja da Atalaia, classificada de Monumento Nacional, pelo Decreto n.º 11453, de 19 de Fevereiro de 1926, que continua como propriedade do Estado Português, com afectação ao serviço da Igreja, administração do imóvel, de acordo com o disposto no art.º 41 do mesmo Decreto-Lei.
(1) Bastante polémica provocou a animosidade da hierarquia da Igreja Católica, nomeadamente, de todos bispos portugueses e da própria Santa Sé e, segundo alguns autores, foi, a par da participação de Portugal na I Guerra Mundial, responsável pela queda da I República (José Relvas, Memórias Políticas, vol. I, Terra Livre, Lisboa, 1977, p. 161)